terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Gesto do Além

Ansiedade de amar, 
Incerteza de algo e portanto nada,
Como é intrigante o real 
E o que escapa sorrindo depois de dias chorando,
A dúvida é tanta e tão mínima
Que como gesto do além foge de mim.

Desentendimento

Por todo este nexo que é desentendimento
E à ilusão faz reverência,
Por tudo que morro em cada dia e sofro ainda mais este mal-estar,
Sofro todo o meu morrer em desgosto.
Alcanço a estrela, o final do dia,
Mas não é alegria,
É profunda e delicada melancolia, 
Que realidade me emprestam e deitam fora,
Que agasalho em nudez rude, 
Só me sei de sinónimos e de vazio empalidece a minha alma
Tão deserta de emoção, 
Vazia de escuro e feita de nobre e triste ilusão

Assunto

Quando esgueiro por aqui e ali,
Quando lua e sol são tudo menos vida
Há algo que furta o sentir no bolso
E sensação a fruta podre.
Acendo a luz do trovador,
Acendo a luz da sala
E há solícita brandura de tarde que foge
E não sei porquê mas fico estático,
Na mente histérico,
Uma flor que bonita,
E tudo é belo nesse instante de regresso ao verso,
A luz por vezes é luz ou lâmpada
E o assunto é assim e assado
Escrevo isto porque não me lembro onde estão os meus óculos escuros.

Não Entendo

Entretanto o tempo vem obscuro,
Como luz fundindo o silêncio
O meu corpo imaterial ainda dorme.
Meu Deus isto que sou
É afinal metáfora de demónio
Sorrindo em doença de manicómio,
Preso, entranhado em células cinzentas,
Não há luz que resista quando acordo para o dia
De todas as trevas de outrora
E ninguém, não há ninguém neste caminho embriagado
Nesta chaga que consome o sangue, odor de solidão.
Obrigado, eterno obrigado por esta vida.
Fico por aqui até me lembrar de desculpar toda esta maldade,
Todo o desgosto, todo este desperdício de gente
Que não entendo, nunca entenderei.

No Enigma

No enigma, no existir, 
No momento de sentir
O sagrado do etéreo do profano,
Há uma luz que se ilumina,
Uma cor que pinta a folha de vermelho.

Tempestades de Verões,
Esplanadas em verso,
Concretizo-me na madrugada do meu regresso.

Porque fui talvez alguém que não sou
E sou quem hei-de ser,
Economias dispersas,
Tolices de chamas, fogo da ilusão,
Mais uma noite e morro,
Mais teatros dispersos 
De dias que custam tanto,
É tão real o que me custa
E tão melancólico que me perco.

Amor a Deus

A sombra da vontade residual
Ainda presente e ausente,
Pois é vão o que desejo
E o que sinto é apenas acessório
Num mundo carnívoro de sensações, de imagens
Que passam e não lembram de se recordar,
O assunto não se define,
É mero instrumento condutor em palavras, ação
Que mora nos corpos despidos, que vestem qualquer coisa,
Não sei, mas a noção de nulidade persiste,
Rostos inanimados, cão, gato e espelho de impressões,
De repente há uma coisa ou algo que mobiliza o sentimento,
Mas esquece ao que vem
E a cegueira mobiliza-me,
É um cântico negro da manhã que nasce
Que foge em aleluias, amens vários,
É nisto que Deus existe
E busco eternamente o grande amor que há em si.

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Atento

Atento em som de maré cheia,
Areia de onda, temporal de chuva,
Barco à deriva que perdeu o sentido,
A orientação, o norte,
A nota musical de piano subtil
É hora dolorosa e que se apartou de sentir,
Magia sem ilusão,
Letra, crucifixo, oração e dor.
Há manhãs que sobram, ausência
E eu que vivo já sem viver,
Eu que já não sei contar histórias à identidade
E regresso ao habitual, ao comum
Sem nada.
Quando sinto a morte em cena de filme
Que é a minha vida
Acendo o sofrimento, a mortalha de fé,
Verso de cegueira, razão que tapa os olhos
Que já viram toda a miséria da existência
A olhar o enredo de futuro que resiste a tudo.

Não

Perder-me na vasta e lânguida paisagem do homem que sofre,
Que chora a sua hora de tristeza agarrado a um canto da sala,
Só em tons de murmúrio que se prende do seu peito tosco,
Como é ausente e distraído nesse leve chorar de nada ter,
Apenas sentir o relógio a sucumbir,
Como tudo é nulo e lento,
Inconsciente,
Como quando se perdoa a existência
Por haver subtração de vozes que em silêncio o puxam
Para o real, para o imanente,
Mas a ausência de tudo escapa ao que observo,
As vozes adensam-se como horário de maior trânsito
E não desculpo este enegrecer
Que é conflito,
É tudo o que não pode ser,
Mas amanhã é o dia de ajustar as contas com o Infinito
E, então, deixo ao homem as contas não declaradas ao legal,
Ao científico, ao marginal, ao escurecer
A minha conta de anos em que fui santo sem o saber.