quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Espiral

A espiral do sonho inspira à ação,
Faço um dia mergulhar em noite,
Faço a maré respirar a cor azul do mar,
Até ao momento pardo o pano ergue a ilusão
E então risos e corpos despidos, figuras ritmadas e silêncios escuros
Pisam a cena que me rodeia até chegar ao limite,
Então embrulho o instante fim
Como um lenço de pano no fundo da algibeira,
É sempre de noite o fim e nunca há limite no infinito de si mesmo,
Na impaciente maneira de gritar ou gemer palavras demoradas que caem como adereços,
A palavra imita-se em si mesma pois é um complexo jogo de xadrês
Ou piano que sopra flores nos ouvidos que espreitam as flores
Que esperam o fim, a estação do mocho,
A delícia do espelho,
O hábito do jardineiro que semeia vento fora de janelas penduradas em corpos semibreves de tristeza.

Silêncio Real

O silêncio é real como se derrete a neve em montanhas glaciares,
A imaginação vê-se em carros e escadas, em pessoas paradas ou que andam,
Mesmo a loucura é racional.
O olho é uma metáfora á vida
E as pessoas sentem mesmo não falando como animais que pastam a vegetação ao seu redor,
Quando observo a paisagem não vejo somente o real,
Mas sinto a cor, o frio, os nervos, a solidão,
Penso em mim e nos outros,
Penso no azul e verde, o que me espera
E tudo o que a rotina de um relógio diurno me diz.
Reparo em recordações, em ambições, deprimo-me,
Impaciente e simétrico, sempre rosto e um frio que rodeia a palavra ser.

Cheiro das Plantas

Um verso, ditado de alquimia,
O que diz um verso no seu reverso,
O que diz o sábio se não sabe,
O que diz um nome se não se nomeia a razão de o dizer,
O que oculta o enredo de um gesto,
Qual o nome deste segredo,
Degredo de assunto que cai na encosta do grito
Que rói uma encosta, que sufoca a impaciência de existir como vento,
Como muro que esconde o deserto, o jardim calado,
A mórbida sentença, o susto da pele na cama dos amantes,
Um solfejo de cores garridas nos instrumentos que rasgam a paz,
Sempre em frente, a vida exausta,
Cumpre-se o fado,
O momento de dizer não ao cálido cheiro das plantas.

Momento de Paz

Sofrendo o nada, este arfar demorado que prende,
O sono involuntário de todos os movimentos tristes que repousam nos olhos do rosto.
Como se traduz o canto de um pássaro?
Como se sente a palavra?
Que mistério encerra o inconsciente presságio
Respirando o suor dos dias?
As tardes de Inverno constroem-me como um abrigo de miragens,
Um olfato de ousadia, um momento sereno de paz.

Distante

Profundo e oco existir, o eco de um silêncio que grita,
Mar que afoga, corrente de marés e enganos,
A guitarra uiva o som de deserto,
Este jeito de imagem, um pente, um drama,
A ocasião de acaso, um passo na direção de cair,
Subir descendo e sobretudo não ir longe, pois o corpo não sente
A manhã de cravo, a tarde fútil,
A certeza de fúria, o rosto na dupla face,
Um câmbio dúbio de incertezas roxas,
Os intérpretes da memória,
Um escasso momento de luz e papel,
Suave, a amplidão de assunto no manto delicado,
Erguer de simetria o pranto
Ou talvez a derrota em fogueiras apagadas,
Nas notas semibreves, o solfejo das flores
Na tarde de sol, a janela sufocante,
A impaciência de gesto sereno como um oficio de vidro
Ou uma trova pálida que respira a geada e o corpo lento
No passo de uma pessoa distante de si mesma.