domingo, 17 de maio de 2015

Olhos de Alma

Somos corpos tristes, pintados no papel de ser gente,
No degredo, no cinzentismo, na ilusão
Caminho os degraus de mimetismo de ontem
E a sorte encarrega-se de sonhar
O que choro contemplando a memória de sofrer como pranto de fonte,
De fronte de calvário,
Os espinhos cobrem o meu manto de treva
E bocejo já a idiotia,
A rotina e retina de coçar a palavra
Amar tantas vezes desenganada,
Tantas vezes me apoiei nos candeeiros
De luz de engano,
Na noite de sono,
De buscar-me no meu arfar
Que encerra a página,
A folha falsificada na letra que treme inconstante
Soprando o meu nome
Que sente o todo eu
Que respira em meu corpo de susto,
Meu amanhã de temporal,
Virtual como uma lágrima
Que cai de meus olhos de alma.

Lixo e Pouco Mais

O calmo entardecer como mentira de um contador de destinos
Vem poisando, devagar, em meu semblante,
Oculto um mistério de ondas
Que rompe o silêncio dos poetas,
O silêncio é a minha mortalha de cigarro,
Encosto-e em muros de peças de barro e antiguidades de mãos de noites de bafio,
Já nada se entorna no sentir que nada valha a pena,
No espelho de vitória a revolta de madrugadas em que corto o cabelo
Um passe de história que não fecha o capítulo,
Talvez finja, talvez não passe o cinzentismo
De mais um cigarro do contador de marés,
Serei o último a rir na decadência de lítio,
Ainda imerso de lodo e olhos com pestanas
Que caem na pedra de olhar o mistério,
Move-se como dança,
Como fumo,
Como filme ou vida que perdi e encontrei e deitei fora,
Lixo e pouco mais.

Teatro das Palavras

Conheço o azar como me lembro da sorte que desconheço,
Sei de emendas e sonetos e canções de serões e bofetadas,
Tenho uma dor de futuro na mágoa de passado
E já traduzi a Constituição para uma língua indígena
E sei de cor os artigos que digo em salas
De pianos de cauda com enfeites de Natal a condizer com a carpete,
Sou fixado em perceber as alíneas e os códigos
Das etiquetas de roupa
Tal como os perfumes e o que escrevo
Poder ser uma mensagem a um nervo óptico
Que percorre o canto do olho até à unha dos dedos,
Quando toco o nariz de me meter à espera
Que o carteiro traga a felicidade
De deixa como teatro de perceber que talvez se mudasse o tema
Dos abecedários me impingissem um papel de carta que entendesse
O frenesim de dizer sim e não ou quando o isqueiro cai
E eu abro a porta vir um pássaro que está numa janela
Me dar os bons dias e me apetece vomitar
Ou se calhar dizer a fala errada no filme do dia
Da sala dos momentos de palavras que rimam com cabelos e sofás.

Espíritos Cansados

Rosto despido de faces e punhais,
A manhã de nuvens cor de cinza embaciadas por um copo de aridez de deserto,
Trago um conto e encanto no faz de conta,
O riso dos enganos,
Talvez ande e corra veloz ou respire o céu de mocho
Que esconde o desejo,
Nada me obriga a ser eu
E eu sou talvez o rosto e o mocho que respira as adversidades
De desenho de areia e praia de romance
De corpos de chumbo
Como poetas da eternidade
Na lembrança que esqueço,
Na inglória sanidade,
A alegria é um fumo que respira no meu peito,
Misto de dor e uma frequência de ritmo de andarilho
Que nada acrescenta,
Pó de amor como loja esotérica de espíritos cansados
Na morte de ousar o sonho.

Lágrima dos Dias

Sou a emoção de pensamento na caravela de momento,
Alegria fugaz, corpo e espaço,
Nada me conduz ao inicio e ao que termina,
A ciência de mudez quotidiana
Nua como pele e sorrir que choro,
Acenar ingénuo e inglório,
Atravessar o cupido de asas de santo
Ao franzir uma sobrancelha,
Nunca fui igual ao que sou,
A pauta das equações na palma da mão,
Lento e atento como punhal,
Dois olhos de choro,
O meu mundo de papel,
Vagueia como barco como corpo desatado,
Sucumbirei no negrume,
Lata de conserva de aprendizes de feiticeiros,
Honesto em minha mentira
De pássaro de horror que se traduz
E se transforma em lágrima dos dias.

Recreio de Pensar

Erguendo o movimento de espadas e espadachim como manhã culta
De originalidade de pássaros e cafés embriagados
Solto a voz de horror, a voz dos poetas, os advérbios de modo,
As plaquetas de sangue, o oxigénio de um beijo,
Ainda não concreto, ainda não me descubro,
Maldizer de dor que revela luz e dor de ciência
Que arrasta o progresso de me erguer novamente
Ao chamamento do amor que empalidece os roseirais de penumbra,
Coro e choro no adeus,
Na força de soprar uma lágrima cansada de chorar
A mesma angústia,
A mesma morte de significado
Que perdi em confétis e noites de riso sério
Como pessoa de animal e animal que
Surge exausto ao recreio de pensar.

Só Eu

Sou só eu, 
Nada mais e somente eu,
Esqueço contrariedades e isto e talvez e assim como emigração de azul
De nuvem de cetim num imenso céu,
Nestas entrelinhas tantas história,
Tantas caravelas cansadas e madeixas descompostas
Na marginalidade de um assobio de infinito,
O poema nada diz,
Sou escritor de emoções que não sentem,
A alegria tatuada em mágoa,
A prenda de envenenamento e sorriso etéreo,
Não sou feliz,
Nada me obriga a cumprir papéis,
Não me pude cumprir,
Não pude ser eu mesmo,
Vou juntando novelos e segredos e degredo,
Nada me trouxe ao lamento senão uma sugestão
E neste amaciar de dias um destino como acaso
De vontade que não sei que ilusão
Transporta.

Encolher de Ombros

Não mesmo assim neste ser que sou e não sou,
Nesta forma que vagueia entre solidão e plantas de enredo,
Neste acrescento de ilusão infinita que não cabe em minha mão cerrada,
Neste cunho de serventia chorar o nada,
A manhã dos costumes ainda ergue o olho de ramela na cera de ouvido
E o príncipe redige a equação de três números com resultado de fim,
A sorte ergue a morte,
A manhã foge como fogueira lenta crepitando ossos,
É fugaz o nós mesmos delirante em encontrar pedras e corpos desnudos
Na ambição de seta de arco medieval,
A colheita dos amores são três barcos numa esplanada num sonho de Verão,
Respiro a letra,
Já a alegria pode marchar a léguas do paraíso,
Já detenho o poder ser,
Amanhã o desnível,
Amanhã rasgo estrelas,
A luz de fogo é um assunto que verbalizo
Na inglória forma de acreditar
No instante de variação de notas de instrumentos de cálculo
Transforma o corpo no que digo,
No que falo, no que não sei e não quero saber,
Não erro a alma,
Não sou o mar calmo que trouxesse a onda de eternidade,
Talvez som e um calmo encolher de ombros neutro como emoção que não vê.

Sangue e Sanguessuga

Mesma palavra como sangue e sanguessuga,
Ventrículo ou copo de vinho,
As mesmas palavras tossem a picardia e o café e os cigarros de dormir,
Sensação de nudez e frio como lâmina ou x-acto,
Carpi anos de momentos estáticos,
Nada me recordo sem me compreender,
A malícia ainda não coça o corpo que diz ser cedo para dormir,
Já os velhos fabricam imagens de contra-mão
E ergo os olhos do chão impaciente e vago,
A miséria vivo e morro como inocente,
Nunca me entendo, nunca vivi ser eu,
Nuca acreditei em mim, sempre vivi no traço de um grito,
Nunca uma ave voou em minha procura,
Nunca ninguém me deu a mão,
Exausto de memória e plano de sinais dolentes,
Quando recordo nada sinto,
A cama cospe incêndios imateriais na mágoa de pétalas,
Nada é luz, consigo sofrer a nulidade de vida de nada,
Caminhar no nada que foge nos olhos que sorriem ao som de pântano,
O som de superfície que responde em corpos de cinema.

Simbolo

A magia de símbolo é a metamorfose do sentido 
Que arrisca a forma de tudo ser uma visão de acreditar 
Que faz sentido o verso de enredo que oculta máscaras,
O templo contempla o tempo
E o perfume de cinza num segredo de barro
Talvez ateie o que a percepção não entende,
Sempre o tacto e o presságio e a voz inumana de união,
Já ouso a palavra de fugir ou esconder,
Já cabisbaixo ao conteúdo de eterno aprendiz de imagem cega,
Rio de anos extenso, a memória branda de pele
Como alquimia de palavras esdrúxulas
Num caderno de Verão,
Numa bicicleta de embaraços,
Numa fogueira de alarido ébrio,
Numa cadeira em cadeia serrada
Na face de poeta oculto em embriaguez.

Vago

Ao ler o que escrevo a morada do mocho,
A luz baça de um livro desbotado,
Um corpo morre,
A energia esgotada por pensar e forçar o inexprimível som de acaso,
Na temperatura de polegada
A imensidão de vento e uma flecha no amor,
Neste embaraço de letras como uma mordaça de tempo de traduzir acasos
Como fados de três cores,
A magia ainda não trouxe a luz,
Ainda não corri em praias de faróis que soluçam a maré lenta dos anos pacificois como naus
Como o que não se diz e se pensa
Como a corsa que foge na bruma,
A trazer a conquista de caçador no peito de leão,
Amor, não alcanço-me,
Nada traduz frutos e espíritos,
A chorar contas e perdões e degredo
De escadas e uma estrada que morre na voz
De abelha e de espinho
De tanto que nada de tudo que enfim vago.

Negação de Diário

O tema é mórbido como negação de diário,
Acho-me por vezes no momento em que toco um nervo,
Na investigação há pássaros e navalhas que luzem como presságio
E no registo cómico talvez encontre o riso que escapa como sinal
Do que me mantém vivo,
Há muito deixei de sentir,
Planícies de emoção quando de mim me desencontrei,
A linha da vida dividida como ardil,
Animais ofegantes de sentidos,
Não trato o que recuso e nesta monotonia
Talvez descubra enfim o repouso que amanhece em decadência,
Apraz a ignomínia,
Soluço no verso cansado,
Quem ousou me profanar talvez pense duas vezes,
Quem de mim ceifou o momento vida talvez olhe na janela
Todos os brinquedos de criança,
A imagética imaterial da cor
É um dedo que cresce como indicador percorrendo maratonas
De viagens ao sono,
Ao ser gente que rompe no sonambulismo de vida que esgota a conversa
E a poesia é a vida desencontrada no que não digo.

Verso Infinito

Deixa-me ser o teu verso infinito,
A ambição de luz,
Caminhar a teu lado, escondido como treva,
Trazer a promessa de beijos na face cansada,
Ser a alquimia de desejo que não se cumpre,
Depois, ser a imagem de nada,
A mortalha que rompe,
O caixão de motivo,
Segredarei o inculto momento de palidez,
O solene canto, a certeza de olhos,
Caminharei até ao fundo da rua em teus desmaios,
Sei-me de cor e sei que alimento estrelas,
O riso é colorido como bola na manhã que trago em meu peito.

Insónias

Há, hoje, um remendo enjeitado como sorriso ao lembrar,
Ao lembrar 
O conceito morre em mentira,
O misterioso desígnio de insónias,
A arritmia de soluços de madrugadas que esquecem
Neste Inferno inconsequente de pensar o cheiro
E o suor de narinas e o majestoso bater de horas,
O artesão de imagens conspira a matéria da linguagem dos vizinhos
Que procriam palavras, transpiram nos sacos de compras,
Em carros andam assuntos e a emigração despida na encosta que morre,
Na passa de cigarro faço o acaso de olhar sempre além,
Nada encanta o olhar o sentido de oculto,
A medicina é uma máquina de futuro,
Na alquimia de rebuçado uma criança leu um livro,
No jardim um cão passeou no tema e contexto de ladrar,
Saberei traduzir o momento quando fechar os olhos
Nas lágrimas de amar isto tudo que chora em mim.

Presságio de Passado

Somos ausências de sons como cinema estático,
As vozes cercam na malícia,
Certamente errado,
No momento de corpo soluço os dias,
A capa de acontecer como emoção gasta,
Já definitivo, já doente, embriagado de dias e noites,
O jogo de mãos de sinais na urgência de grito,
Imagino a substância de uma garrafa e sei-me ser eu que sou,
Que compreende tudo ou não,
O cinema das palavras como pauta ou alecrim ou musgo nos muros de namorar,
Na página de livro falo com verbos e visto as vogais
Num gesto tão atroz como um ninho de águias de pedra e cal,
Amanhã o processo de ler a teoria de enredo
E noite e bafio e palacetes de exames,
Enredam o parecer de um cigarro que arde na chama de tossir significados ,
Que colorido é o Pôr de Sol na praia,
Cansaço de luz e um jeito de acenar já embebido em rigor,
Como uma cerveja caída na beira de estrada
No presságio de passado.

Prado Verde

Gaiolas de prado verde na imaginação torpe,
Andarilho siamês de conteúdo ainda convalescente,
A magia de correcção de suspeitar,
Lúgubre no tempo dos horrores de ponteiros que justificam,
A manhã é tarde de lamento,
Encerrar o oculto em mãos maceradas de lavatório de figura abstracta,
Não, ainda, não sei e dança,
Flores de enredo como planície e Infinito de imagem que agoniza,
A morada de capataz descobre os véus semi-nus de mulheres tom de cinza,
Na delicadeza de sentir a pessoa imaculada de persistir o dia,
O ar, rarefeito, organiza nuvens e o Sol irradia a emoção de músculos,
Choro de corpos em religião,
Amanhece novo capítulo, nova união,
O grito cansado demora a erguer
A voz de sinfonia errada,
A voz que irradia a mensagem de pianos,
Um cão deriva no verso,
Crianças de traços oblíquos não acendem o momento.

Muros e Contextos

A cidade arde muros e contextos,
Livros de olfacto, a embalagem rosa,
No fim de me perder, rosto macio,
Rock sempre gasto, embaciado,
Repito a onda, a emoção ainda resiste,
Nesta calma de sobretudo que me cobre o corpo de desaire,
Ouço o limite, o mar de olhos,
A destreza de funil, de alambique,
A testosterona, o ditado infantil,
Tudo é um sorriso, tudo desnecessário,
Um hino ao amor na manhã dos corpos cansados por ser dia,
Figuração de cinema nas linhas que fazem andar
No vasto sermão deteriorado de noites frias,
Ainda não acordado
Ao espelho imaginado.

Real

As letras juntam-se ligeiras em frente às árvores 
Como esperam por ser Sol, ser fruto,
Das mãos de seiva e flor
O operário, cansado, faz malabarismo com ouvidos nas paredes,
O gesto de cinema, os olhos, pestanas e artimanhas,
O silêncio inunda a sala como um tom de mármore e
A frequência de rádio debita sons de carne no sorriso que morde,
Num quadro de arranjar o fusível
Ainda faz noite e a luz ainda apagada,
Uma parede de corpo existe e uma mão, um sentido,
Ainda não faz real aquilo que sinto.

Quimera

Não sei se consigo a quimérica vida sonhada,
Custa ser eu nesta demanda de processo,
Resisto na ambiguidade de ser que procuro,
Enterros de pessoas como exames de consciências,
Quando morrer far-se-á luz na Terra,
Mas o que resta a este corpo senão desdém,
Já origem e embaraço,
A mansidão não conheço apenas batalhar o mundo,
Se espelho não chega
A imagem não é real,
O corpo caminha só mas atravessa almas,
Sempre nocturno em dia de paz,
Pensei em ser outro e não pude,
Sempre o reflexo e imagem e eu não mesmo eu,
Nulo e gasto,
O meu filme resiste a choros e desníveis,
Nunca fui quem quis ser não podendo ser quem sou,
Sei de muros e reclames e rótulos,
Tudo que passa na penumbra de sonhar,
Não alcanço,
Não me pertenço e dou-me sem definição,
Identidade desapropriada
Encontrada no faz de conta,
Talvez encontre quem sou na ambição de sentir que valeu a pena viver.

Luz Enigmática

No escuro e terno momento ainda guardo 
No cheiro do nascer de dia
Um amor embriagado como cor de fronteira
Como lata de comida ou dia de feira,
Nada me lembra certa imagem de olhos e vento,
O silêncio vestia tons de riso
Na comédia em três actos,
Na fábrica de lenços de emoção
Chorei a vida
E dolente como regresso teci o manto de pranto
Como vida comum,
Não crente em palavras acendi um corpo de fantasia
Inalcançável a todos, distante como léguas de cartoon
Na esfera de delito de filme animado,
Sempre lua, mar e canto,
Sempre luz enigmática
No processo de me reconhecer em letras que rasgam a liberdade.

Mistério de Eu

João Carlos,
Este nome gasta-se como cor 
No meu peito, palavra nua, latejando por luz,
Ainda não este nome,
Nunca, talvez e sempre,
Sou o meu nome inconclusivo,
Enigmático como ciência,
A ficção de morte,
A alma despida,
Não real, não sou eu,
Deturpado roendo o coração,
Não perco este nome,
Vou, embalado, rumo ao encontro embaciado,
Ruas e becos sem saída
Na esteira de me conhecer,
Perdendo-me e achando-me na ideia de meu nome gasto e inconcreto,
Nunca fugi o meu nome mesmo ambíguo,
Mesmo só, sou eu,
A luz não acende ritmo de choro,
Ainda memória irreal,
Ainda não cumpro,
Só e escuso,
Tarde para encontrar sentido de eternidade
Que reside no mistério de eu.

Alquimia

A chuva dos sentidos numa ilusão de números,
A imagem do sentido convalescente imerge,
Na alquimia de traduzir murmúrios e refrões de canto secular 
Enterro o meu machado de cinza pálido na terra ainda molhada,
Ao refrear a manhã ainda carpi mágoas como vidro lascado
E no teu corpo, estátua indefinida, sempre gasta e inacabada
Mergulhei o movimento de existir como uma espada ao trespassar a carne,
Não fujo de ti,
Sei que sou breve como lágrima
Que custa o infinito de dor,
Na face descaída de relógio atrasado costuro impaciências
No constante momento que resvala no riso de xilofone,
Na parede de sombra,
No contador de histórias que não dorme,
Em mim já se calou a vida,
Durmo e justifico como imagem sem reflexo,
Candelabro exausto
Na manhã que sobra todos os dias.

Vozes de Sombra

Contemplo o imenso adeus de sobrar-me o corpo
Neste adeus perdido de amanhecer sem norte,
A noite chama-me,
Conheço sua voz que percorre as veias
Como se aproximasse o Natal de infância,
O Natal das formigas, a voz do escuro, enigmática,
Não ouço ritmo e estático um som de Além,
Mistura cores e desníveis,
Dramas de saudades ancoradas no peito,
Tenho palavras que fogem na boca de migrarem nas fronteiras de me pressentir nu como alma,
Derrame de videira na sementeira de lenha,
Há muito perdi o projecto de mim,
Na fantasia entrego a paz e caminho junto do silêncio
De forma a se calarem as vozes feitas de sombra.

Manhã Desunida

Vivemos palavras, mas vivemos mesmo o secreto segundo de existir,
Respiramos ódios e a esperança nula,
Filme de caricatura e andamos às cegas no movimento,
No momento de pronúncio arrastamos o corpo
E a imagem rompe o silêncio de marioneta,
De sermos afinal ambição triste, incapaz e desconhecida
Na multidão de nós mesmos, cansados e inumanos de vivermos sós,
Sem agasalhos de afectos,
De amor inconcreto,
Há muito somos um elo de cosmos derrotado em pele cansada,
No copo embriagado de meia noite
Há lamentos e mães que choram
E no rosto uma lágrima invisível escorre até ao umbigo,
Até quando apagaremos a mágoa e somos nós
Deserdados de vento
Latejamos frio de mãos e carapaça de tudo que sentimos
Ser como um dia de todos os dias,
De riso virgem
Que rompe a aurora de magia na manhã desunida.

Conceitos

A mistura de pó desabrigado de momento estático
Num casario de hera e sapiência,
Nostalgia de ramos de animais que fogem os conceitos
Tão longe de si mesmos,
Nota de alface no mês de Março,
Segredo colibri da madrugada.
Não atear o corpo e viver incerteza,
Muito se estica a placidez e a vastidão de mar
Como o ombro que anoitece na cama,
Ainda não adormeço contando equações milimétricas de contas e rosários
De milhões de anos residuais de enganos,
Esta noite estremece a luz
E levantar a coroa demora na face
Descaída em desmaio
De três mal-me-queres de ilusão
De passagens da Bíblia,
Sereno e realidade falsificada como Natividade
Ou whisky destilado de noite só,
Gomos de resina e balões de santos
Entretanto deixo a luz e encarno em nome distante,
Nunca sei ser eu,
Nunca me sei,
Talvez a magia de infinito,
Corpo desunido e convalescente como um piano ou um actor vestindo a imagem de vento.

Destino

As fronteiras definem a imaginação
De corpos, espírito, matéria, espaço,
Se somos carne somos vicio
E enrugamos e morremos todos os dias
Como uma corrente que não se explica,
Trazemos olhos e pestanas que nem sentimos,
A face por vezes afogueada,
Não importa o provérbio ou o desdizer,
Somos o silêncio e o barulho,
O mar e talvez a lágrima,
Os anos estremecem e aprendemos o desaprender em novos ofícios,
A luz por vezes branda por vezes apagada,
Saltamos letras e regressamos sempre a nós
No destino que não sabemos.

Amarras do Vento

Solto nas amarras de vento,
Na história de maestro um leve sentimento,
Escola azul celeste no corpo, 
Navio de azulejo ancorado no fim,
Nada te disse no triste soluçar
De carpir a tosse e o espirro de soluço,
Nasceu um dia um rosto profano,
Nasceu o mundo numa semana
E os dias apagavam a noite de breu e estrelas semi-nuas
Na lua de segredo que rosna como uma fábula,
No ritual de rir, no sereno remédio de sentir,
No atchim e como vais?
Em relva e jardim zoológico
Como se varrêssemos uma estátua
De perfeição incolor
Nada é tanto como nada é tudo
Como imagem fechada, como lápis de cera
Em desenho rasgado,
Na frase por acabar de verso longitudinal e perpendicular
Á frase de riscos e pauta de música de assobio na luz da manhã.

Emoção Lenta

A emoção lenta como imagem de espelho,
O boneco lento no colo sereno de imaginar,
Transfusão de inocência de anos que rompem o pano de teatro vago e aniquilado 
À destreza de dedos que contam anos que morrem como idade,
Na mascarilha de príncipe uma superfície de sorrir quando bocejo já a solidão
De dedos e enredos que fogem anos,
Dia de telhados,
Dia de enganos,
Todos os dias máscaras,
Poeiras como perfumes de lágrimas que sorriem a decadência de suaves ilusões,
Não sou eu, nada me trouxe a este tempo de morte indecente,
A leveza que morro na dureza de reagir quando não é sim,
Sim, corpo e demência, um rosto que respira
No lixo quotidiano do que sou.

Reinvenção da Manhã

Reinventamos a manhã,
Cavalo alado de nuvens de Sol frio,
A ferida de som no peito desbotado,
Cinzento e pardo o desejo,
Sempre nulo e estático,
Talvez descemos o vão e subiremos a colina cantando
A ambição de todos os dias
No incêndio de mármore,
Na balança que morde o horóscopo,
A veia que responde no manipulo do ser.

Paciência de Amanhã

Mar irreal de ideia,
Mar, vento,
Mordaz em sentir,
Corpo de estrela macio de miragens,
A onda, espuma no corpo nu,
Confessionário de mágoas
No sentimento de não entender o que perco,
No que acho,
No afecto desisto,
No acordar perdido,
Verso, fósforo arde em metáfora,
Animal que rosna a tarde presa no acento,
Pontuação que respira,
Embriagado de mundo,
Azul de raiva,
Paciência de amanhã.

Silêncio de Frio

O silêncio do frio
Na imagem de riso
Carpindo o momento de assunto
Como café na esplanada desabrigada de corpo,
Multiplicada ao Infinito de dedos e músculos
E faces pálidas
E uma feira de latidos de corpos que descansam
Na ingratidão de Lua no Sol de olhos
Como cego de si mesmo
Deambulando vento,
O cinzento de praia,
Imensidão de desejo,
Sacrifício de sanidade,
Oxigénio de astro
Na origem causada de suspiro criador,
Riso, anjos em contra-luz,
Rosário que resmunga preces no tempo do mundo,
Cicatriz de vento,
Paisagem de faro,
Relógio de paz como sagração de Primavera,
Palavras que usam dicionários do significado de nada
E limpar arestas de sentir o puro momento
De novos rostos de mães,
Pensamento de lírio,
Fotografias de sonhos,
História de confessar a mão nula de ombro de carne que esconde lágrimas.

Energia de Assunto

Cheirar o perfume,
A energia de assunto,
A imensidão de pedra na tristeza,
O nariz enche-se de ar e sopramos a geografia de emoção,
Ter certezas e caminhar como um cavalo da história,
Soberbo e sereno,
Ouvir o momento,
Atento a tentáculos e jasmim,
Esbracejar a manhã de tulipa cansada
No peito atroz,
Resistir ao soco,
O mar vem, vem, como definhar ou dor que escapa
Na hora de reagir
Como tudo é perfeito quando o azul é céu e ao vestir
A côr somos o chão de pessoas que olham o movimento
Da gaivota que plana a imagem
Que respira a rosa do marfim
De pétalas caídas na tarde lenta de uma mãe
Que ri ou chora,
Na imensidão de faz-de-conta um suspiro a mais é lume,
Os lenços e as gravatas como crianças que pais serenam nunca é demais,
O gesto de crescer a ser alguém
Como nós não fomos,
Queremos dar e receber,
Sofrer e acrescentar
Na forma de sempre amar mais longe
Como um rio de peixes que pescados
São alimento de corpos e encolher perante
O espetáculo da Natureza
Que é maior que todos nós.

Tarde de Cansaços

A tarde de cansaços chega lentamente
Como emoção de vidros irreais,
A feira dos sentidos ao luar de corpos que respiram os poros
De ilusão demorada,
Braços e respiração em cadência,
Tudo é paz e conforto
No momento de mergulhar,
De soluçar o gesto,
O silêncio sobra como estátua,
As flores delicadas com olfatos de maçãs
Em dia de Verão fazem a dança
De arrastar a colmeia dos dedos
Na areia que desce na figura de sopro,
Toscos ramos de impaciência num único gemido.

Silêncio Armadilha

No silêncio armadilha de respiração
O acto áspero de jeito de existir na face de história de resina,
Acentuação de mármore e placidez de Outono como número
Amargo de copo de incerteza,
Na contagem de carneiros como suspiro de adormecer
Na calada da noite um era uma vez
Narrado no singelo materializar de alma,
A vontade de elevação numa canção que rosna como animal ferido e denso,
A escola da primária reconstruída num momento cinza
De esquecer o sonho de matéria
Que resta no colo materno de penas,
Ninho deriva na palha de corpos crescendo em cartaz
De pano de cenário como árvore genealógica
De resíduos de bicicletas temporais sem abrigo
Nos teatros que contam histórias a cegos
Que colam a roupa em molas e cabides
Sem corrimão de escadas de barulho,
Sinal de reza em memória de acabar
O delírio de banda desenhada,
Na irmã carpideira
De versos mastigando carne
E olhos que encovam a madrugada já exausta de emergir
No corpo que ainda dorme em gestos de danças de armário
Em que sopro a mão como sorrindo o instante chave.

Janela de Imaginar

Em sereno rumor de palavras que ressoam sentidos
Na alma breve de ler,
Métodos de sorrir como livro de caracteres de corpo e olhos
Que respiram imagens e sons cansados para dentro de sentir,
A face e os animais desprendem-se de objectos
E preso no limite de tempo
A oferta de mortalha na paz de encher fumo de cigarro
Como um ritmo de cidade que ainda não é tarde e não é cedo,
As crianças passeiam-se em amanhãs que fermenta como cor
Na musica de ser actual e bege
E trazer o motivo e causa como lança
De acreditar no verso como uma sobrancelha,
A maquilhagem
De pó de arroz e um volte-face,
A maneira de dizer que existo e insisto,
Só moro em consoantes que gritam,
Ainda não eu,
Decifrar-me-ei no futuro que enreda
Que perde o que ganho no vago sabor de vitória,
A luz é um seixo que repousa
Na janela de imaginar.

Papeis Demorados

Abre a madrugada,
Um canto de nascente sorri o espanto,
Alma em relevo nos olhos de fera,
Nada é maior que tudo nisto que custa crescer,
Nem cicatrizes ou reclames ou olhos
Sabem de mim,
Sentir que turvo sou como algo que resmunga,
Indecifrável e desumano num rosto sempre ausente,
Equações que olham o perfil
De que nada diz ser mimetismo de conta
Que acrescenta conta na tristeza fugaz,
No burburinho alimentar os passos
Andando entre figuras e paredes desabrigadas
De som ou calares de histórias
Que nem ser o que são por não se pensar
Em se ser que somos na ambiguidade de
Voltar a casa imerso de nuvens e
Algo irrealizável
No instante que se olha o sentimento
De sentir os olhos
Que secam lágrimas
Em mundos de desalinho
De sonhar sempre mais
Que o sonho,
Que desejo,
Mãos nos bolsos tateando moedas,
Sempre longe,
A utopia de mais nada dito,
Desdito e como prefácio de livro que não se lê
Pendurado em alguma estante de papéis demorados.

Hora Exata

Decidir a fixidez, a hora exacta,
O leve enlanguescer da manhã
Metamorfose de corpo de laranja e rosa,
Em atropelos e multidões corro em busca de mim
Como animal de submundo
Em busca de um gesto que indique a voz,
Ser eu que me perco em rostos e soluços de memórias,
Um jornal que gasta tinta de chuva
Num dia que cospe fogo
De silêncios,
Perdi o jeito nocturno,
A vaga maneira de me transformar,
Respirar a fuligem de aragem do negro,
Luzes acendem a ilusão
De afecto e um assunto nulo de existir um mocho
E um desgosto por ter percorrido as noites de carne e ossos,
Num dia que fecha olhos,
Janelas do relógio responde tosse no cinema de emoção,
No afago como pedinte de sombras
Dispo o corpo como vício,
Mergulho em sono,
Pressinto a nota de musica
Da madrugada de todos dias ser luz.

Vento Embriagado

Ao despertar como mago de sombras nulo e gasto
Penso no sonho de momentos que ainda recordo,
O relógio de meia estação pregado em alguma parede
Como respiro o vento embriagado,
Ausente de rotinas,
Apenas cabeça que aguenta
Mais corpo,
Resisto no som de vitória,
Hoje trago um cravo na lapela,
Eu não respondo o perfume e as palavras de idiotia
Como uma gaivota abrigada de ser dia,
Sorriso no frigorífico,
Todos os dias riso,
Já não se apaga a raiz, um gomo de raiva
Como tradução da fronte de luz,
Na jangada de pele
E no erro tantas vezes distante de querer como oculto.

Teatro de Mim

Os actores da minha pessoa
Ainda se mexem como sombras e fragmentos de sonho irreal,
A Democracia é como comunista de mim,
Levaram-me poses, anéis, figuras de estilo,
O teatro da minha pessoa é realmente interessante
Como se fossem bonecos de criança,
Mas sem inocência, como se fosse o homem dos sonhos
E carregasse o resto de mim
Em palavras de solidão, morte, amor, saudade,
As definições são um delírio
E no teatro as personagens têm carne
E quando as desligo vão para casa,
Para vidas que desconheço,
Agem no escuro, olhando
E regulando, porque não posso ser quem sou no jogo de querer ser
O que o sonho não permite,
Na hora do chá as personagens riem se me rio,
Choram se choro e pensam no que penso,
A comédia passa a drama e se me zango
Há uma dose de filme de ação
Como filme de John Wayne,
Assim bebo um chá de trevas
E sismo no teatro de mim.

Imagens de Livros

As imagens de livros ansiosas em palavras que roem,
Suavizam arestas,
Árvores de papel de lúcida abstração
Como pássaros chamando o mundo,
A sirene ainda longínqua no segredar de açoite
Mesmo enegrecido volto à casa do sono,
Conceitos chutam conceitos,
A palidez é um sonho,
Visões de terras de aridez e sem assunto
Que carrego num fechar de olhos à face da lua,
Hoje em dia a mulher espera ser cedo,
Não há silêncio,
Tudo ensina a ciência da liberdade,
O rio desigual de ritmo e cansaço,
Nada é como nada que sou no relógio de momento,
Ainda janela ou ambição de burros e andar despretensioso
Como já nada sobra de resíduo de justiça,
Embarcações de paz no sítio certo,
No degredo, no deserto,
Na onda sempre longe que perto tarda.