terça-feira, 7 de julho de 2015

Abre a Madrugada

Abre a madrugada,
Um canto de nascente sorri o espanto,
Alma em relevo nos olhos de fera,
Nada é maior que tudo nisto que custa crescer,
Nem cicatrizes ou reclames ou olhos
Sabem de mim,
Sentir que turvo sou como algo que resmunga,
Indecifrável e desumano num rosto sempre ausente,
Equações que olham o perfil
De que nada diz ser mimetismo de conta
Que acrescenta conta na tristeza fugaz,
No burburinho alimentar os passos
Andando entre figuras e paredes desabrigadas
De som ou calares de histórias
Que nem ser o que são por não se pensar
Em se ser que somos na ambiguidade de
Voltar a casa imerso de núvens e
Algo irrealizável
No instante que se olha o sentimento
De sentir os olhos
Que secam lágrimas
Em mundos de desalinho
De sonhar sempre mais
Que o sonho,
Que desejo,
Mãos nos bolsos tateando moedas,
Sempre longe,
A utopia de mais nada dito,
Desdito e como prefácio de livro que não se lê
Pendurado em alguma estante de papéis demorados.

Hora Exata

Decidir a fixidez, a hora exacta,
O leve enlanguescer da manhã
Metamorfose de corpo de laranja e rosa,
Em atropelos e multidões corro em busca de mim
Como animal de submundo
Em busca de um gesto que indique a voz,
Ser eu que me perco em rostos e soluços de memórias,
Um jornal que gasta tinta de chuva
Num dia que cospe fogo
De silêncios,
Perdi o jeito nocturno,
A vaga maneira de me transformar,
Respirar a fuligem de aragem do negro,
Luzes acendem a ilusão
De afecto e um assunto nulo de existir um mocho
E um desgosto por ter percorrido as noites de carne e ossos,
Num dia que fecha olhos,
Janelas do relógio responde tosse no cinema de emoção,
No afago como pedinte de sombras
Dispo o corpo como vício,
Mergulho em sono,
Pressinto a nota de musica
Da madrugada de todos dias ser luz.

Sem Amor

A imensa luz que resta é uma vela num quarto 
Que olha a velhice, rugas e choro,
Não sobeja nada,
Nem alegria, nem ilusões,
Deserto de alma que respira um lamento,
Uma cerveja que fica num copo abandonado,
Mexo o espelho, talvez mais uma imagem,
Um exame, uma inspiração,
O mocho do rosto, o corpo de sala,
Ainda não eu, ainda a pele,
Desperdicio que embala um soneto de Camões
Na beira de uma estrada,
A rir-se de si mesmo ao sentir-se infantil
No que não sou, no vicio de calar
A imensa voz de canto de choro,
Pranto despido de incoerência,
Palavras de romantismo sem cupido, sem flechas,
A dormirem em silêncio
Porque incomprensíveis a todos
Na maneira de ser como verso de flor de mato
Que sem olfato tateia a cor sempre sem amor.

Choro Cego

Por entre o meu cansaço, por entre o meu caminho
Há sonho de maresia, há memória sem fim,
Na face do momento agito sinais de fim
Na esteira de regressar ao inicio,
De me conhecer,
Que constante loucura me pedem,
Meu padecer que arrasto como franja de cabelo
Como ser cedo para ser outro novamente,
No que não posso ser, pois estou certo que não serei capaz
De virar a página triste e maldita,
A vida sadia,
Ser eu custa como uma imagem de riso
Ou a solidão de noites,
Na verdade construída de embaraço,
No risco que traço em corpos azuis de hoje,
Fecho a minha cara de granizo,
Unidade somente minha,
Que há pescadores tentando resgatar a razão de rosto
Que não respira
E como e rezo e durmo,
E sobrevivo sempre no que não sou ou sei reinventar
Em assunto que resta e custa digerir como uma sandes de atum
Ou um cigarro depois de um café branco
Destilado na bebedeira de dor de cabeça
Que é todos os dias,
Custa-me ver letras,
Custa a perfeição,
Quando vem outro dia,
Quando me abandonam como animal doente
Numa qualquer estrada,
O meu ir e vir
A inocência dos astros,
A letra senil que ouve o choro cego de futuro.

Palavras

A palavra masculina de ênfase,
Manifestação de letra
Surge ao sentido nomeando frases
Do significado que entende,
A escrita e os olhos pestanejam
Ao de leve as margens e as letras compostas e arranjadas
Subindo trémulas ao olhar que significa
A razão de ler o que o poeta
Disse não dizendo, aparentando o conteúdo dúbio
De uma coisa é muito que não é ou poderá ser
No câmbio de sugestão,
A comunicação não é diretamente o que é,
O poeta escreve, simboliza, sente,
O leitor apenas percebe a encenação
Do conteúdo da vaga ideia impressa.

Outro Sentido

O capítulo de mágoa no livro dos dias,
A encenação de leve rubor de ossos
Acordando o mecanismo de locomoção de vida lenta,
É estática e sem sentido
Na boca de silêncio e paz,
Ouve o progresso no ouvido de ausência
Do real frívolo de sempre,
O monótono labirinto de alma
Que rasga imaginação colorida de lápis de cera
Nos dedos da ansiedade de crescer até ser noite,
Sou irreal, não alcanço arestas,
As teias de rostos de sons oblíquos que
Faz a cabeça bater sincronizada em utensílios
E olfacto de rasto de me perder
Em bonecos andarilhos que mastigam as palavras
Para dentro, para fora
Até ser outro sentido.

Esquecimento de Sentir

Ser alguém que recordo não sendo eu,
Esquecimento de sentir,
Ainda a farsa de me não reconhecer, ainda não,
Talvez amanhã mais ou menos eu que sou,
Que me descubro e reconheço,
A minha veia de sangue, o meu corpo só,
Apago coincidências, ando em aparências,
Miro o espelho de dentes plano de reticências de luz,
O sagrado e o profano,
Bonecos despojados de olhos,
Os pés salientes, a cama chora a imagem de roupas,
Embaciado de glória de humanismo
E três desejos de rir como nada que digo,
Sentimento ao de leve como uma ferida,
Enfim piano cálido de pressentir o medo de mim.

Sono

Como embriagada é a vida em lenta agonia,
A placidez de momentos como um náfrago, como barco ou cruz,
Os nós demorados de ninguém e a certeza de somente palidez ou ramos,
Agita noite a imagem de vento,
A manhã incolor que desfolho o acordar nú,
A semente e a súplica,
A morada, a estrada,
Estáticamente o rugido de uma mão,
Cegos e ciganos e crianças,
Uma escola, um prédio,
O sonho começa na cidade
Resmunga os dias,
O céu espera por eternidade,
Desliza a palavra no café de soluço
E uma conta faz uma tapeçaria no momento de dizer até sempre
Como antigamente se escavassem detritos,
Como se apagasse a luz dos cegos
E se ungisse de sono

O leito cor de rosa de tigres de savana.

Não Me Vejo

Não me vejo, não reconheço ao ver
A cara, o contorno de papiro,
A leve sobrancelha rodeando a cavidade de globo ócular,
A boca pálida, um soluço,
Uma vaga imagem de côr que rodeia a sala como sombra
Como ideia que insisto e nula por não ser real,
Ergo a luz e uma lua de pastel cinzelada de brilhantes,
Corpo inerte quando me deito extasiado,
Verso de madrugada, do regresso e de progresso,
Enredo de praça de hoje ser um dizer que não interessa,
Mais folhas e papéis que risco com cruzes como dias prisioneiros de vida,
Uma sopa de fome que sacio como palavra de rosto
E um carrossel de filmes idiotas
No silêncio de ócio, de ódio,
De palavras negras e negação de palavras que não se lêem,
São machucadas e raspadas como manhã, como Verão,
Nisto de inútil que são palavras,
A arte palavra que sai da boca e desce no som de palavra
Até ser ouvida na orelha distante,
O som é significado e transformado, centrifugado em resposta de palavras como um processo
De comunicação como nariz que cheira
Ou mão que aperta uma mão sentindo o tato.

Ser

Eu sou uma pessoa e nisto sempre busco a essência de ser eu,
Sou eu que sou sem artifícios ou filme ou teatro,
Escrevo pessoa que sou e talvez perco identidade num cartão de cidadão
Que resta o meu nome e dos meus pais,
Nada me sobra de ser eu que sou por vezes que não sou,
Perdido e gasto por entre margens de outros e enganos,
Por vezes doente, por vezes tosto, mas sempre pessoa,
Não perco esta palavra ao infinito de mim mesmo e que reencontro num acenar surdo de semelhante ser,
Sou eu que me busco distante de fugas e sereno de me sentir,
Nada também me pertence como alma que carrego no ventre despido de arraiais e desconsolos,
A tristeza de lágrima, o som de piano,
A marcha lenta de morrer,
A bofetada infantil, os passos que ouço todos os dias,
A realidade que deturpada é riso e sono de regresso
E tarde de retrocesso,
A pessoa infinita de música que costura impaciências num segundo
E em eternidade sou eu no aceitar resignado de dizer sim como festa,
Como noite de copos e qualquer coisa de noite que transpira códigos,
Encerro o corpo num fechar de olhos,
A morada celestial que abrigo na minha emoção sempre minha,
Sempre exausta, sempre como nada que perco e ganho
No momento de ser gente.

Sonhos Embriagados

Em sonhos morri parado e quieto,
Ninguém que sou distante,
Os olhos fechados, as mão em cruz no desejo,
Este eu navega em sombras e 
Guerreiro de alma que cala a morte,
Acorda de cabeça em punho na existência,
Trouxe-me tão lento e enraivecido por pensar
Nisto de morrer há décadas dentro de mim,
Em sonhos doloridos e apagados,
Todos os dias novo rosto e desconheço-me
Ao som de pensamento azul que se dilui ao vento pardo da manhã,
Ser dia de existir e sobreviver em meus ombros desniveis de soluços
E rugidos de ruminar quando sonho um sonho morre atrás de mim
E renasço em vida de sonho que uso num olhar que permanece
Como um livro de horas,
Quando é dia de rir estremeço à luz de Sol,
É sempre dia no oceano de trompete
Que ouço maquinalmente todos os dias em que sonhos embriagados
Adormecem a meu lado.

Estátuas

Neste oceano, sons ocos de ondas
Em praias, areias,
Somos um homem, uma criança
Dispersas como vento dentro de nós,
O assunto ondeia como labirinto,
A alma espreita, assustada,
Por dia final,
A inauguração de uma lápide da memória,
Os ossos, o crânio
Ainda demoram no corpo
Lento de fugir para onde o sonho dorme,
Em desenhos de parede,
Num berlinde, no fundo do tempo
Onde a máscara de lua emigra no espaço
De ser eternidade
Até ao limite inventado de estátuas.

Que Tenho?

Que tem este jeito de nada ter senão a pergunta
Se terei algo meu,
Nada tenho senão um gesto,
Este ódio despenteado, este modo embaraçado
De perseguir-me à exaustão
Como fantasma de ópera
Numa redoma de vidro,
Sei existir e persisto em não sair de ambição apenas
Sou o indizivel de mim mesmo como um carpir de olhos
Na esteira de adormecer serenamente como pomba
Ou entoação de grito disforme de socorro,
Sei a palavra que desidrata,
Amar como nada e papéis
Sobretudo os papéis e a voz zonza, estridente,
O carro passa longamente
E um disparate que ri no espelho das imagens,
Cimento em camadas,
A altura de não alcançar o movimento de cair
E geralmente não ser idade, não ser som
Na maior parte do tempo que escorre impaciencias
De cópia como cábulas e destino de futuro
Que desaparece sem marcas.

A Vida Adormecida

A impaciência do olhar parado,
Aguarda instruções de ser dia,
Ser sinal que chora,
A palavra sem sentido
Porque não existe no que pensamos,
A mórbida curiosidade de Sol
É a voz dos tempos,
A glória de habitar a imagem,
A ação de guarda chuvas,
O planeta não sorri
No acto de dor queimada,
Labirintos desabrigados
Encenação doentia, calada e ausente no grito contido,
Ainda o segredo da caixa de musica da bailarina cega,
O poeta cuspindo,
A viuva que morre todos os dias,
A palavra encenação de código
Como leques destituidos de carne tresloucada
No instante em que adormeço a vida.

Frio Demente

Hoje deriva o nada,
Fogo de pardais e um lenço,
Amanhã a gaivota prende a asa no sonho diluído,
Desisto da calma em rostos de ir dentro de mim,
Regresso a um torso, uma vaga retumbância,
Um acorde de náufrago de cetim marinho e ténue,
Ainda existo nas letras como um ninho
E um caminho que empurra a minha força que resiste
Em tempos de costuras e medicamentos
Como um pêssego que trouxe no bolso,
A merenda num dia de Sol,
Calmo o olfato que respira a maré que incomoda,
Acaricio o rosto de fim de viagem,
Tantas feridas que não sinto,
Tanta palidez no toque,
Que frio demente isto que sinto.

Praia e Mundo

Infeliz desilusão convalescente,
Nasce o grito na face,
Em ondas desiguais, campos, imagens de frio,
O riso é pálido e sôfrego,
Mastigo vogais, sofro o álcool destilado numa lágrima,
A janela desunida é um animal de raiva
Nesta tarde que suspira letras e cores
Que são um abecedário de crianças de óculos
Resmungando a vida deitada,
Subi ao conceito que cai pela montanha
No precipício de nuvem de almas,
Sempre a melancolia que recordo
Como este encolher de ombros,
Nesta paz de minutos morna e sufocante
De erguer o verso que como alfaiate
Costurando impaciências
De corpos estrelas
E corpos demorados
Com pedras que andam como castelo construído
Na minha mente que serena
Ao vento de imaginação num enredo
De praia e mundo.

A Casa

A casa move-se como um circuito,
A casa tem árvores e um ramo de jasmim,
Em fronteiras de morte o objeto labareda
Acena como esquece cinza
Que afaga o chão de mar,
Acalma espírito, ainda mar,
Ainda me afogo no vento,
Há transtorno em cavar o assunto, escasseia no arroz
De refeição da casa,
Arranho a asa convalescente num arrepio,
Tanto e nada como olhos pintados,
Emigro em momentos de estar em todo o lado,
A casa mexe-se no tato rugoso da parede,
A rapariga toca na porta da morada a seguir ao rosto
Derrotado,
Num pano, num dedo,
Um germe de horror na porta, na janela,
Na palavra passe do encenador da casa
Faz silêncio.

Rosas

Rosas como teias derivam das janelas
Beijando a manhã,
O mocho, o lírio e o corpo acordam
Trajando um passo apressado no jardim dos silêncios,
Tudo o que me rodeia
A teatralizar, esculpindo o verso,
Letras de paz rompem no rosto como ouvidos em segundos de prece,
No jardim do momento em que se olha duas faces agonizando
No desejo, no deserto de si mesmos,
A pirâmide do asfalto ergue o sonho
Que insinua vento ao passar o húmido suspiro
De nada dizer como um segredo de livro exausto
Na cabeceira da cama que se arrasta na ambição de luz
E olhos que choram futuro,
Os pés são frios nos lençóis que exalam um perfume de alfazema,
São muitos desunidos ais,
São muitas as mágoas que me adormecem os sentidos
De Sol que não escurece o dia
Que como roda traz-me o sonho de ser noite
Tudo o que recordo.

Meu Corpo

Meu corpo a três dimensões de planos lunares vigentes e ocidentes,
Intempestivos no acaso do soco que me cala a voz,
Tenho o incidente de bater na porta gasto de subir escadas eternas em pedaços 
Como esta nuvem que nada em céu,
Nada o pente e uma navalha no gesto,
Deriva a madeira do barco no macio do chão
E os macacos deliram nas jaulas abertas ao ar comprimido
Do soalho que estala da casa da multidão cega de olhos nús,
Ainda o mundo no respirar frio do deslizar de rosto,
No fogo embaciado de si mesmo
Ao pranto de aias de mosteiros e motins de presos como outra era
De dormir assuntos de aulas gastas,
A maçã derrete a árvore na saliência projetada de sombra
Que arrefece o exame preso no tempo de lembrar tudo o que esqueço
Ao recordar de isto como se sorrisse observando o noturno pássaro
Que dança a chuva de adeus
E um filme na órbita do punhal
Enterrado ao âmago de palavra eficaz e precisa de acertar o peito que mexe
No cálido voo de máquina de mosquito que enche o rio de sonho e sabor de medo
Que estuda o silêncio escondido por detrás da cabeça que repete o braço de mimetismo
Aberto à luz de sempre.

Grito de Multidão

Faz-me falta como sentisse que não me faz falta
Esta imagem decadente,
Este estado inquieto,
A suave distância de presságio como uma carta
Ou uma lua de risos em tardes de cores afuniladas em verso,
A maneira secreta de ouvir a imagem parada do futuro
Que em nós se mexe
Como voo de águia nos penhascos de alma
No irreal, no texto semi-frio,
Na nota de pena suicida,
Em vagões de rodas de mar azul pálido,
Refrescos em vãos de escada
A sorver os assuntos.
É um caminho demente em torno da luz
Que respira o suor,
O corpo, o umbigo,
Esta esperança de olhos turvos,
A madrugada de xaile
Que dança nas mulheres acesas ao grito de multidão que se perde.

Não Ser Eu

Adeus, despeço o sentido de adeus,
Entrego-me emoção nua de desejo de fim,
No cinzento de moradia, na planta, na ilusão,
Ainda a incompreensão, sei de tudo o que me resta,
Não, ainda falta a luz aumentando o pensamento,
Até quando o sonho que não alcanço
E bêbado de faces e dança e musica
E actores e desenraimento
E soluços e dores,
Tanto o que carrego quando olho no céu
A leitura de fechar os olhos e parar,
Quero o preciso, o atual, o clean,
A magia falece o sonho de mais do mesmo
De novo e entretanto espero livros,
Espero a madrugada,
O medicamento da alma ressuscita o crente
E eu desmaio em ondas que afogam a certeza
De não ter sido na vida verdadeiramente eu.

Cimento

O vazio da imensidão como nada 
Que respira no diverso de cinco dedos,
As chagas, o nariz calvo, 
A manhã de luz que chove na palavra cenário de luta,
Ri-me de ti como pressentimento, como sábio, 
Dolorido em versos delirantes na nuvem que ondeia Aparentemente como mago,
A nota carmesim na boca como o cheiro de emprestar o céu nos bolsos de orvalho,
Arranha a cama, tudo nosso verso,
Assim que respiro o concreto de ser,
O cimento no sangue rente à palavra de medo,
Falo baixo como se absorvesse as silabas,
Ainda o ritmo da consoante de outrora que esburaca o nervo,
Somente eu irreal e frenético como manto, como mente,
As marés, os óculos junto do nariz,
A frase constrói o barco,
Assimétrico corpo,
A perfeição é um momento frio e gasto.

Tempo

É lento um século,
Passos de dor, solstício de vento,
Alegoria fantasma em dia cinzento
A letra de rosto carpindo um eterno adeus,
Demoro no gesto, é dura a imagem de céu
Na ambição de aguentar o nada de si mesmo
Que por mim deixa de existir
Como tempo fugisse de espaço
De buscar a frequência de ler
O desengano de apagamento,
A leitura pobre como silêncio,
A estátua mímica de emoções
Como fio de prumo, novelo de existir
Em verbos de raiz de sono
Sem estilo de corpo,
Apenas olhar isto que foge de assunto
No barco que se afasta de dentro de onda
Que rema impaciências
No vão tempo fugitivo que não consigo alcançar.

Aparente

Respondo a emoção na aparência,
A centésima vez na miragem, a consciência,
Nada me trás o meu perfil,
Nada é igual ou talvez, não me lembro de mim,
Nunca me vi,
Um tiro de nós,
Irritado por não trazer a surpresa,
Se canto ou senão,
Tenho-me em vida exausto,
No cume maior que me condensa,
A roupa nua em gritos,
Tatuagem que rompe o frio,
Mais de mim se não me sei igual,
Já papel e desenho,
A luxuria de imaginar,
A sofreguidão de rir como completos
De cidade e e tempestade
E sempre ilusão de trazer esta melancolia
Enjeitada neste corpo desabrigado.

Coisas da Alma

Entristece a árvore e o tojo campestre,
A súplica de beijos, a união e a negação
Como se fosse corriqueira a vida que sonhasse
Na manhã que nasci,
No telescópio de imagem residual de pássaro
Como se céu contesse um aquário na água vazia de som
A imensa perda de trunfos de alegorias
Vazias de fungos que enchem estes olhos que por vezes dormem no mistério
Intergaláctico que não entendem
No fundo do dedo que acena moral
De anel e fato de gala e bengala e laços e confétis
E toda a tralha que construímos em pó de casa numa década de silêncio,
No muro que cai de tons ambíguos e inóquos
De miséria e detrito de palavras que constroem
E destroem a imaginação de tudo o que cabe numa boca
Percorrendo as artérias e células
E remédios e momentos que ouvimos pianos em grafonolas
No entrudo e sapatos lentos
De pisar sempre estes assuntos
Que carregamos nos pés toda a vida sem serenar
Estas coisas da alma.

Nada Que Digo

Não sei dizer nada que digo
E prosar versos que nascem como flores
Como janelas sobre Lisboa,
Fragatas, varinas e marujos,
Dias que não são comuns,
Um dia que é imenso,
Vida inteira cheia de nada,
Esplanadas de ilusão, negras como frase de jornal,
Dia de latim, dia de tossir,
Despeço os verbos, o acto solene,
Já nada me lembra o outrora que relembro com impaciência,
A margem discreta de atravessar uma seta
Ao sentido contrário de morte
Como faz sentido acordar no momento das deixas que engolem
A luz de soprar o sentir quando olho o relógio
Para me lembrar que ainda faço sentido
Quando me toco na esperança
De me ouvir lento, rosa e ambição
De roubar palavras nos dicionários que exprimem ditados
Oferecidos em noites trágicas,
Luzes que acendem para passar o conteúdo,
Isto que não morre,
Livro de horas e sangue nos telhados
De tudo que discorre de olhos e teatros de fé,
Aplausos multifacetados e serenos
Na praça de jogar-me no jogo de escorrer o cabelo em rios
De folhas que riem como se de pranto as impaciências
Doloridas em nuvens e manchas
Trouxessem a liberdade que busco como
Corpo que construo num grito
Que trago dentro do meu peito.

Apenas Luz

Sempre as palavras e atos como mágoas
Como não digo os sentimentos de abeirar-me junto de ti e dar-te
Um beijo como sinto este ardor dentro do peito
Ao ferir-me nestes anos como arma,
Como uma roleta russa na face do desespero de
Ainda não me libertar da tua palidez e dos conselhos
Que resmungo nas manhãs de frio de afeto
Sempre eu que não sei o que sou e o que tenho não me tendo,
Por vezes não, assim perco-me
E relembro-te sempre neste abraço como se as
Minhas mãos fossem garras
E te acenassem pela vida fora dentro de mim
Na mais profunda emoção de sorrir-te ao de leve
Como memória imaterial de tudo ser breve,
Um pouco de nada de ser isso que confundo
Quando a noite ainda respira o sonho de futilidade
De ser apenas luz.

Impaciências

O lamento é uma fuga na dispersão,
Quando aponto uma imagem o som cai,
Lentamente, no papel, no silêncio, num ai,
Num ápice, nuvem, hálito,
Demora ainda o ser que recobra pedaços no chão de todos os dias,
Momentos e estátuas lisas,
Desmaios sem dor,
A máscara enigma no processo rosto
De cheirar o corpo espelho,
A visão de feixes lunares que luz enganos
Nas entrelinhas de céu
Desaparece na inocência de arrastar ainda colunas,
Ainda versos
Na sequência de resolução de palavras homens,
Palavras mulheres,
Ainda a sombra de um lápis sereno,
No registo de dar o nó
Ao volte-face, à imagerie,
Palavras que saltam no jogo de cidade
Incandescente de abrigo ao perpétuo nome que ri
A mística de gramática corpo de escultura como câmbio
De tortura e
Língua escura e dura no ato de falar o que sinto
E que resiste ao teste de compreender o vidro embaciado,
O relógio atrasado,
A cultura campo de conceitos e criticas alinhadas com o gracejo
Sempre a preceito no canto da boca
Que agita a fama e o duro golpe
Da fazenda do traje,
O sapato de vela e uma caravela no cinzento riscar de fósforo animal
De seta de vento no mar de impaciências.

Saber Pensar

Esta dolência, este perecer,
Esta aspereza do momento, 
A leve curva de desaparecer,
A ambição de jurar o coração ao limite já vivo e morto e
Sentir que vale a pena o frenesim, o real ilusório,
Confrontos e moinhos de vento na minha cabeça ainda presente
Ao engano de anos de vida como ideia
De ser o meu sonho, a luz,
A fuga de mim nos dedos de glória
Na sede de imensidão,
A audácia de longo curso,
Lento e figurativo
Na ciência que sorri há décadas,
A mão recobra,
O instante saudável de encontrar o que busco ser afinal tudo
O que não decifro e tudo o que germina
Como jardim de pensamento
No verso imenso e delirante de saber pensar.

Sentido de Amar

O capítulo noite e luz na cabeceira da cama,
O pavio e o lume desembaraçado de gestos,
Ainda sagrado e profano na minha melancolia,
Aves monstras que ficam em terra
No desejo de voarem nos céus,
Trazer a esperança que morre todos os dia em peitos de dor,
A semente de ócio e baloiços de penugem de artimanhas
Como adolescentes que soluçam a vida de sempre,
O retrato amanhece, estou triste,
Lisboa é um naufrago distante,
Uma entidade que chora emoção,
Desisto no enredo,
As palavras brancas como casulos enigmáticos de cores sombrias
Nos ninhos descabelados,
Os estendais trazem corpos pendurados
Á luz semi-rígida de lembrar,
Encerro o passo cru,
A leve sombra, a faca, o mocho,
Tudo um processo lento de buscar o sentido de amar.

A Critica

A critica, a razão pura das coisas sensíveis,
Isto inumano, o que sinto,
Uma vaga impressão, um pensamento azul ao de leve,
É como uma impressão digital de mágoa,
Um texto de resgate sem sentido
Escrito há duzentos anos
Na praia com raios de Sol e
Lentamente o corpo acorda a solidão preguiça
Da almofada desunida da cama,
O livro paciência e o riso de silêncio,
Ainda procurando afetos em esquinas que rosnam a manhã
Nos corpos de trabalho,
No alimento, na recordação de ontem,
A perfeição construída no desenho de parede,
O deixar ir, o encontrão,
Tosco e mendigo no que choro
Ainda dói, ainda,
Nada é inteiro, nada é completo,
As palavras têm antenas e morrem,
As palavras fogem nas minhas mãos de madrugada,
Mistérios de presságios e
A luz que resta é imaginação que cai em imagens despidas de vento.