sexta-feira, 19 de junho de 2015

Mesma Palavra

Mesma palavra como sangue e sanguessuga,
Ventríloco ou copo de vinho,
As mesmas palavras tossem a picardia e o café e os cigarros de dormir,
Sensação de nudez e frio como lâmina ou x-acto,
Carpi anos de momentos estáticos,
Nada me recordo sem me compreender,
A malicia ainda não coça o corpo que diz ser cedo para dormir,
Já os velhos fabricam imagens de contra-mão
E ergo os olhos do chão impaciente e vago,
A miséria vivo e morro como inocente,
Nunca me entendo, nunca vivi ser eu,
Nuca acreditei em mim, sempre vivi no traço de um grito,
Nunca uma ave voou em minha procura,
Nunca ninguém me deu a mão,
Exausto de memória e plano de sinais dolentes,
Quando recordo nada sinto,
A cama cospe incêndios imateriais na mágoa de pétalas,
Nada é luz, consigo sofrer a nulidade de vida de nada,
Caminhar no nada que foge nos olhos que sorriem ao som de pântano,
O som de superfície que responde em corpos de cinema decadente.

Face de Poeta

A magia de símbolo é a metamorfose do sentido 
Que arrisca a forma de tudo ser uma visão de acreditar 
Que faz sentido o verso de enredo que oculta máscaras,
O templo contempla o tempo
E o perfume de cinza num segredo de barro
Talvez ateie o que a percepção não entende,
Sempre o tacto e o presságio e a voz inumana de união,
Já ouso a palavra de fugir ou esconder,
Já cabisbaixo ao conteúdo de eterno aprendiz de imagem cega,
Rio de anos extenso, a memória branda de pele
Como alquimia de palavras esdrúxulas
Num caderno de Verão,
Numa bicicleta de embaraços,
Numa fogueira de alarido ébrio,
Numa cadeira em cadeia serrada
Na face de poeta oculto em embriaguez.

Verso Infinito

Deixa-me ser o teu verso infinito,
A ambição de luz,
Caminhar a teu lado, escondido como treva,
Trazer a promessa de beijos na face cansada,
Ser a alquimia de desejo que não se cumpre,
Depois, ser a imagem de nada,
A mortalha que rompe,
O caixão de motivo,
Segredarei o inculto momento de palidez,
O solene canto, a certeza de olhos,
Caminharei até ao fundo da rua em teus desmaios,
Sei-me de cor e sei que alimento estrelas,
O riso é colorido como bola na manhã que trago em meu peito.

Ao Lembrar

Há, hoje, um remendo enjeitado como sorriso ao lembrar,
Ao lembrar 
O conceito morre em mentira,
O misterioso designio de insónias,
A arritmia de soluços de madrugadas que esquecem
Neste Inferno inconsequente de pensar o cheiro
E o suor de narinas e o majestoso bater de horas,
O artesão de imagens conspira a matéria da linguagem dos vizinhos
Que procriam palavras, transpiram nos sacos de compras,
Em carros andam assuntos e a emigração despida na encosta que morre,
Na passa de cigarro faço o acaso de olhar sempre além,
Nada encanta o olhar o sentido de oculto,
A medicina é uma máquina de futuro,
Na alquimia de rebuçado uma criança leu um livro,
No jardim um cão passeou no tema e contexto de ladrar,
Saberei traduzir o momento quando fechar os olhos
Nas lágrimas de amar isto tudo que chora em mim.

Presságio de Passado

Somos ausências de sons como cinema estático,
As vozes cercam na malícia,
Certamente errado,
No momento de corpo soluço os dias,
A capa de acontecer como emoção gasta,
Já definitivo, já doente, embriagado de dias e noites,
O jogo de mãos de sinais na urgência de grito,
Imagino a substância de uma garrafa e sei-me ser eu que sou,
Que compreende tudo ou não,
O cinema das palavras como pauta ou alecrim ou musgo nos muros de namorar,
Na página de livro falo com verbos e visto as vogais
Num gesto tão atroz como um ninho de águias de pedra e cal,
Amanhã o processo de ler a teoria de enredo
E noite e bafio e palacetes de exames,
Enredam o parecer de um cigarro que arde na chama de tossir significados ,
Que colorido é o Pôr de Sol na praia,
Cansaço de luz e um jeito de acenar já embebido em rigor,
Como uma cerveja caída na beira de estrada
No presságio de passado.

Torpe

Gaiolas de prado verde na imaginação torpe,
Andarilho siamês de conteúdo ainda convalescente,
A magia de correção de suspeitar,
Lúgubre no tempo dos horrores de ponteiros que justificam,
A manhã é tarde de lamento,
Encerrar o oculto em mãos maceradas de lavatório de figura abstrata,
Não, ainda, não sei e dança,
Flores de enredo como planicie e Infinito de imagem que agoniza,
A morada de capataz descobre os véus semi-nus de mulheres tom de cinza,
Na delicadeza de sentir a pessoa imaculada de persistir o dia,
O ar, rarefeito, organiza nuvens e o Sol irradia a emoção de músculos,
Choro de corpos em religião,
Amanhece novo capítulo, nova união,
O grito cansado demora a erguer
A voz de sinfonia errada,
A voz que irradia a mensagem de pianos,
Um cão deriva no verso,
Crianças de traços oblíquos não acendem o momento.

Acordado

A cidade arde muros e contextos,
Livros de olfacto, a embalagem rosa,
No fim de me perder, rosto macio,
Rock sempre gasto, embaciado,
Repito a onda, a emoção ainda resiste,
Nesta calma de sobretudo que me cobre o corpo de desaire,
Ouço o limite, o mar de olhos,
A destreza de funil, de alambique,
A testosterona, o ditado infantil,
Tudo é um sorriso, tudo desnecessário,
Um hino ao amor na manhã dos corpos cansados por ser dia,
Figuração de cinema nas linhas que fazem andar
No vasto sermão deteriorado de noites frias,
Ainda não acordado
Ao espelho imaginado.

Letras

As letras juntam-se ligeiras em frente às árvores 
Como esperam por ser Sol, ser fruto,
Das mãos de seiva e flor
O operário, cansado, faz malabarismo com ouvidos nas paredes,
O gesto de cinema, os olhos, pestanas e artimanhas,
O silêncio inunda a sala como um tom de mármore e
A frequência de rádio debita sons de carne no sorriso que morde,
Num quadro de arranjar o fusivel
Ainda faz noite e a luz ainda apagada,
Uma parede de corpo existe e uma mão, um sentido,
Ainda não faz real aquilo que sinto.

Liberdade

No escuro e terno momento ainda guardo 
No cheiro do nascer de dia
Um amor embriagado como cor de fronteira
Como lata de comida ou dia de feira,
Nada me lembra certa imagem de olhos e vento,
O silêncio vestia tons de riso
Na comédia em três actos,
Na fábrica de lenços de emoção
Chorei a vida
E dolente como regresso teci o manto de pranto
Como vida comum,
Não crente em palavras acendi um corpo de fantasia
Inalcançável a todos, distante como léguas de cartoon
Na esfera de delito de filme animado,
Sempre lua, mar e canto,
Sempre luz enigmática
No processo de me reconhecer em letras que rasgam a liberdade.

Vidro

A chuva dos sentidos numa ilusão de números,
A imagem do sentido convalescente imerge,
Na alquimia de traduzir murmurios e refrões de canto secular 
Enterro o meu machado de cinza pálido na terra ainda molhada,
Ao refrear a manhã ainda carpi mágoas como vidro lascado
E no teu corpo, estátua indefinida, sempre gasta e inacabada
Mergulhei o movimento de existir como uma espada ao trespassar a carne,
Não fujo de ti,
Sei que sou breve como lágrima
Que custa o infinito de dor,
Na face descaída de relógio atrasado costuro impaciências
No constante momento que resvala no riso de xilofone,
Na parede de sombra,
No contador de histórias que não dorme,
Em mim já se calou a vida,
Durmo e justifico como imagem sem reflexo,
Candelabro exausto
Na manhã que sobra todos os dias.

Vozes de Sombra

Contemplo o imenso adeus de sobrar-me o corpo
Neste adeus perdido de amanhecer sem norte,
A noite chama-me,
Conheço sua voz que percorre as veias
Como se aproximasse o Natal de infância,
O Natal das formigas, a voz do escuro, enigmática,
Não ouço ritmo e estático um som de Além,
Mistura cores e desníveis,
Dramas de saudades ancoradas no peito,
Tenho palavras que fogem na boca de migrarem nas fronteiras de me pressentir nu como alma,
Derrame de videira na sementeira de lenha,
Há muito perdi o projecto de mim,
Na fantasia entrego a paz e caminho junto do silêncio
De forma a se calarem as vozes feitas de sombra.

Manhã Desunida

Vivemos palavras, mas vivemos mesmo o secreto segundo de existir,
Respiramos ódios e a esperança nula,
Filme de caricatura e andamos às cegas no movimento,
No momento de pronúncio arrastamos o corpo
E a imagem rompe o silêncio de marionete,
De sermos afinal ambição triste, incapaz e desconhecida
Na multidão de nós mesmos, cansados e inumanos de vivermos sós,
Sem agasalhos de afectos,
De amor inconcreto,
Há muito somos um elo de cosmos derrotado em pele cansada,
No copo embriagado de meia noite
Há lamentos e mães que choram
E no rosto uma lágrima invisivel escorre até ao umbigo,
Até quando apagaremos a mágoa e somos nós
Deserdados de vento
Latejamos frio de mãos e carapaças de tudo que sentimos
Ser como um dia de todos os dias,
De riso virgem
Que rompe a aurora de magia na manhã desunida.

Ausente

A mistura de pó desabrigado de momento estático
Num casario de hera e sapiência,
Nostalgia de ramos de animais que fogem os conceitos
Tão longe de si mesmos,
Nota de alface no mês de Março,
Segredo colibri da madrugada.
Não atear o corpo e viver incerteza,
Muito se estica a placidez e a vastidão de mar
Como o ombro que anoitece na cama,
Ainda não adormeço contando equações milimétricas de contas e rosários
De milhões de anos residuais de enganos,
Esta noite estremece a luz
E levantar a coroa demora na face
Descaida em desmaio
De três mal-me-queres de ilusão
De passagens da Biblia,
Sereno e realidade falsificada como Natividade
Ou whisky destilado de noite só,
Gomos de resina e balões de santos
Entretanto deixo a luz e encarno em nome distante,
Nunca sei ser eu,
Nunca me sei,
Talvez a magia de infinito,
Corpo desunido e convalescente como um piano ou um actor vestindo a imagem ausente.

Amarras de Vento

Solto nas amarras de vento,
Na história de maestro um leve sentimento,
Escola azul celeste no corpo, 
Navio de azulejo ancorado no fim,
Nada te disse no triste soluçar
De carpir a tosse e o espirro de soluço,
Nasceu um dia um rosto profano,
Nasceu o mundo numa semana
E os dias apagavam a noite de breu e estrelas semi-nuas
Na lua de segredo que rosna como uma fábula,
No ritual de rir, no sereno remédio de sentir,
No atchim e como vais?
Em relva e jardim zoológico
Como se varressemos uma estátua
De perfeição incolor
Nada é tanto como nada é tudo
Como imagem fechada, como lápis de cera
Em desenho rasgado,
Na frase por acabar de verso longitudinal e perpendicular
Á frase de riscos e pauta de música de assobio na luz da manhã.

Reinvenção

Reinventamos a manhã,
Cavalo alado de núvens de Sol frio,
A ferida de som no peito desbotado,
Cinzento e pardo o desejo,
Sempre nulo e estático,
Talvez descemos o vão e subiremos a colina cantando
A ambição de todos os dia
No incêndio de mármore,
Na balança que morde o horóscopo,
A veia que responde no manipulo do ser.

Ideia

Mar irreal de ideia,
Mar, vento,
Mordaz em sentir,
Corpo de estrela macio de miragens,
A onda, espuma no corpo nu,
Confessinário de mágoas
No sentimento de não entender o que perco,
No que acho,
No afecto desisto,
No acordar perdido,
Verso, fósforo arde em metáfora,
Animal que rosna a tarde presa no acento,
Pontuação que respira,
Embriagado de mundo,
Azul de raiva,
Paciência de amanhã.

Assunto

O silêncio do frio
Na imagem de riso
Carpindo o momento de assunto
Como café na esplanada desabrigada de corpo,
Multiplicada ao Infinito de dedos e músculos
E faces pálidas
E uma feira de latidos de corpos que descansam
Na ingratidão de Lua no Sol de olhos
Como cego de si mesmo
Deambulando vento,
O cinzento de praia,
Imensidão de desejo,
Sacrifício de sanidade,
Oxigénio de astro
Na origem cansada de suspiro criador,
Riso, anjos em contra-luz,
Rosário que resmunga preces no tempo do mundo,
Cicatriz de vento,
Paisagem de faro,
Relógio de paz como sagração de Primavera,
Palavras que usam dicionários do significado de nada
E limpar arestas de sentir o puro momento
De novos rostos de mães,
Pensamento de lírio,
Fotografias de sonhos,
História de confessar a mão nula de ombro de carne que esconde lágrimas.

Natureza

Cheirar o perfume,
A energia de assunto,
A imensidão de pedra na tristeza,
O nariz enche-se de ar e sopramos a geografia de emoção,
Ter certezas e caminhar como um cavalo da história,
Soberbo e sereno,
Ouvir o momento,
Atento a tentáculos e jasmim,
Esbracejar a manhã de tulipa cansada
No peito atroz,
Resistir ao soco,
O mar vem, vem, como definhar ou dor que escapa
Na hora de reagir
Como tudo é perfeito quando o azul é céu e ao vestir
A côr somos o chão de pessoas que olham o movimento
Da gaivota que plana a imagem
Que respira a rosa do marfim
De pétalas caídas na tarde lenta de uma mãe
Que ri ou chora,
Na imensidão de faz-de-conta um suspiro a mais é lume,
Os lenços e as gravatas como crianças que pais serenam nunca é demais,
O gesto de crescer a ser alguém
Como nós não fomos,
Queremos dar e receber,
Sofrer e acrescentar
Na forma de sempre amar mais longe
Como um rio de peixes que pescados
São alimento de corpos e encolher perante
A Natureza
Que é maior que todos nós.

Gemido

A tarde de cansaços chega lentamente
Como emoção de vidros irreais,
A feira dos sentidos ao luar de corpos que respiram os poros
De ilusão demorada,
Braços e respiração em cadência,
Tudo é paz e conforto
No momento de mergulhar,
De soluçar o gesto,
O silêncio sobra como estátua,
As flores delicadas com olfatos de maçãs
Em dia de Verão fazem a dança
De arrastar a colmeia dos dedos
Na areia que desce na figura de sopro,
Toscos ramos de impaciência num único gemido.

Chave

No silêncio armadilha de respiração
O acto áspero de jeito de existir na face de história de resina,
Acentuação de mármore e placidez de Outono como número
Amargo de copo de incerteza,
Na contagem de carneiros como suspiro de adormecer
Na calada da noite um era uma vez
Narrado no singelo materializar de alma,
A vontade de elevação numa canção que rosna como animal ferido e denso,
A escola da primária reconstruida num momento cinza
De esquecer o sonho de matéria
Que resta no colo materno de penas,
Ninho deriva na palha de corpos crescendo em cartaz
De pano de cenário como árvore genealógica
De resíduos de bicicletas temporais sem abrigo
Nos teatros que contam histórias a cegos
Que colam a roupa em molas e cabides
Sem corrimão de escadas de barulho,
Sinal de reza em memória de acabar
O delírio de banda desenhada,
Na irmã carpideira
De versos mastigando carne
E olhos que encovam a madrugada já exausta de emergir
No corpo que ainda dorme em gestos de danças de armário
Em que sopro a mão como sorrindo o instante chave.

Rumor

Em sereno rumor de palavras que ressoam sentidos
Na alma breve de ler,
Métodos de sorrir como livro de caracteres de corpo e olhos
Que respiram imagens e sons cansados para dentro de sentir,
A face e os animais desprendem-se de objectos
E preso no limite de tempo
A oferta de mortalha na paz de encher fumo de cigarro
Como um ritmo de cidade que ainda não é tarde e não é cedo,
As crianças passeiam-se em amanhãs que fermenta como cor
Na musica de ser actual e bege
E trazer o motivo e causa como lança
De acreditar no verso como uma sobrancelha,
A maquilhagem
De pó de arroz e um volte-face,
A maneira de dizer que existo e insisto,
Só moro em consoantes que gritam,
Ainda não eu,
Decifrar-me-ei no futuro que enreda
Que perde o que ganho no vago sabor de vitória,
A luz é um seixo que repousa
Na janela de imaginar.

Papéis Demorados

Abre a madrugada,
Um canto de nascente sorri o espanto,
Alma em relevo nos olhos de fera,
Nada é maior que tudo nisto que custa crescer,
Nem cicatrizes ou reclames ou olhos
Sabem de mim,
Sentir que turvo sou como algo que resmunga,
Indecifrável e desumano num rosto sempre ausente,
Equações que olham o perfil
De que nada diz ser mimetismo de conta
Que acrescenta conta na tristeza fugaz,
No burburinho alimentar os passos
Andando entre figuras e paredes desabrigadas
De som ou calares de histórias
Que nem ser o que são por não se pensar
Em se ser que somos na ambiguidade de
Voltar a casa imerso de núvens e
Algo irrealizável
No instante que se olha o sentimento
De sentir os olhos
Que secam lágrimas
Em mundos de desalinho
De sonhar sempre mais
Que o sonho,
Que desejo,
Mãos nos bolsos tateando moedas,
Sempre longe,
A utopia de mais nada dito,
Desdito e como prefácio de livro que não se lê
Pendurado em alguma estante de papéis demorados.

Todos Dias

Decidir a fixidez, a hora exacta,
O leve enlanguescer da manhã
Metamorfose de corpo de laranja e rosa,
Em atropelos e multidões corro em busca de mim
Como animal de submundo
Em busca de um gesto que indique a voz,
Ser eu que me perco em rostos e soluços de memórias,
Um jornal que gasta tinta de chuva
Num dia que cospe fogo
De silêncio,
Perdi o jeito nocturno,
A vaga maneira de me transformar,
Respirar a fuligem de aragem do negro,
Luzes acendem a ilusão
De afecto e um assunto nulo de existir um mocho
E um desgosto por ter percorrido as noites de carne e osso,
Num dia que fecha olhos,
Janelas do relógio responde tosse no cinema de emoção,
No afago como pedinte de sombras
Dispo o corpo como vício,
Mergulho em sono,
Pressinto a nota de musica
Da madrugada de todos dias ser luz.

Raiz

Ao despertar como mago de sombras nulo e gasto
Penso no sonho de momentos que ainda recordo,
O relógio de meia estação pregado em alguma parede
Como respiro o vento embriagado,
Ausente de rotinas,
Apenas cabeça que aguenta
Mais corpo,
Resisto no som de vitória,
Hoje trago um cravo na lapela,
Eu não respondo o perfume e as palavras de idiotia
Como uma gaivota abrigada de ser dia,
Sorriso no frigorifrico,
Todos os dias riso,
Já não se apaga a raiz, um gomo de raiva
Como tradução da fronte de luz,
Na jangada de pele
E no erro tantas vezes distante de querer como oculto.

Perto Tarda

As imagens de livros ansiosas em palavras que roem,
Suavizam arestas,
Árvores de papel de lúcida abstração
Como pássaros chamando o mundo,
A sirene ainda longínqua no segredar de açoite
Mesmo enegrecido volto à casa do sono,
Conceitos chutam conceitos,
A palidez é um sonho,
Visões de terras de aridez e sem assunto
Que carrego num fechar de olhos à face da lua,
Hoje em dia a mulher espera ser cedo,
Não há silêncio,
Tudo ensina a ciência da liberdade,
O rio desigual de ritmo e cansaço,
Nada é como nada que sou no relógio de momento,
Ainda janela ou ambição de burros e andar despretensioso
Como já nada sobra de resíduo de justiça,
Embarcações de paz no sítio certo,
No degredo, no deserto,
Na onda sempre longe que perto tarda.

Café Matinal

No café matinal uma cidade nasce, no peito, atrás do monte,
Levemente, não deixando rasto na voz de todos os dias
Que muda consoantes e vogais de calendário,
O mapa imaginado de ser mais um dia,
No atropelo de multidão um sermão de peixes
E um boneco nas mãos cansadas de erguer o rosto,
Desfiz a imagem no espelho de progresso
De acrescentar mais rugas no semblante que acha graça
Ao dia monótono de mais
Uma peça de orvalho no funda da alma
Querendo chorar o tempo
Decifrar o papiro de atualidades,
Degredo e justiça de finalidade de coçar os olhos ainda doloridos da manhã cor pálida,
No tempo desabrigado de vento o Sol ainda
Papagueia como um rebuçado na boca das crianças com mimo,
Todos os dias é a metáfora de principe
Olhando o nada, olhando o sonho, olhando o nada que me resta
Nesta voz de imagem cansada.

Sem Amor

A imensa luz que resta é uma vela num quarto 
Que olha a velhice, rugas e choro,
Não sobeja nada,
Nem alegria, nem ilusões,
Deserto de alma que respira um lamento,
Uma cerveja que fica num copo abandonado,
Mexo o espelho, talvez mais uma imagem,
Um exame, uma inspiração,
O mocho do rosto, o corpo de sala,
Ainda não eu, ainda a pele,
Desperdício que embala um soneto de Camões
Na beira de uma estrada,
A rir-se de si mesmo ao sentir-se infantil
No que não sou, no vicio de calar
A imensa voz de canto de choro,
Pranto despido de incoerência,
Palavras de romantismo sem cupido, sem flechas,
A dormirem em silêncio
Porque incomprensíveis a todos
Na maneira de ser como verso de flor de mato
Que sem olfato tateia a cor de sempre sem amor.

Dispersos

Por entre o meu cansaço, por entre o meu caminho
Há sonho de maresia, há memória sem fim,
Na face do momento agito sinais de fim
Na esteira de regressar ao inicio,
De me conhecer,
Que constante loucura me pedem,
Meu padecer que arrasto como franja de cabelo
Como ser cedo para ser outro novamente,
No que não posso ser, pois estou certo que não serei capaz
De virar a página triste e maldita,
A vida sadia,
Ser eu custa como uma imagem de riso
Ou a solidão de noites,
Na verdade construída de embaraço,
No risco que traço em corpos azuis de hoje,
Fecho a minha cara de granizo,
Unidade somente minha,
Que há pescadores tentando resgatar a razão de rosto
Que não respira
E como e rezo e durmo,
E sobrevivo sempre no que não sou ou sei reinventar
Em assunto que resta e custa digerir como uma sandes de atum
Ou um cigarro depois de um café branco
Destilado na bebedeira de dor de cabeça
Que é todos os dias,
Custa-me ver letras,
Custa a perfeição,
Quando vem outro dia,
Quando me abandonam como animal doente
Numa qualquer estrada,
O meu ir e vir
A inocência dos astros,
A letra senil que ouve o choro cego de futuro.

Lágrima Triste

Em que pensarei agora no momento vago,
Na iluminação de trazer começo ao verso
Que, sonâmbulo, acorda ideias ainda dormentes,
Ainda não caçam o acontecer na imagem
Do vago acordar,
Como estrela que se olha na imensa noite
Os olhos são um esvoaçar
De mágoa como cinema de escuro final,
Sem happy ending,
Nada que escuta, nada que semeie amor,
Apenas a incerteza de melodia,
Talvez faça um pacto, talvez melindre o jogo de peão,
O jogo de faz de conta
Como artimanha de idiotia,
Enfim, lavam-se tintas e corpos
Receoso no sempre longínquo sonho
Que me circunscrevo,
De ilusões aqueço um eterno bocejo
No serenar de mágoa que aceita tudo
Porque o engano é plano,
O silêncio escava segredos
Na sentença de cabeça que ri
Ao mudo espanto
De acender a luz ao verso de ser alegria
O momento oportuno de sentir que
Vale a pena sentir-me só no meu mundo de contrastes,
Da ciência de embaraço,
No jogo de cabra-cega que rói a convalescença,
De acabar com o ser pequeno,
No ser que nasce todos os segundos
Na nossa emoção de olhar o porto de partida no destino
Que chega e vai como pássaro infinito
Do mundo que não alcanço na embriaguez de uma lágrima triste.

Gramática

A palavra masculina de ênfase,
Manifestação de letra
Surge ao sentido nomeando frases
Do significado que entende,
A escrita e os olhos pestanejam
Ao de leve as margens e as letras compostas e arranjadas
Subindo tremulas ao olhar que significa
A razão de ler o que o poeta
Disse não dizendo, aparentando o conteúdo dúbio
De uma coisa é muito que não é ou poderá ser
No câmbio de sugestão,
A comunicação não é directamente o que é,
O poeta escreve, simboliza, sente,
O leitor apenas percebe a encenação
Do conteúdo da vaga ideia impressa.

Outro Sentido

O capítulo de mágoa no livro dos dias,
A encenação de leve rubor de ossos
Acordando o mecanismo de locomoção de vida lenta,
É estática e sem sentido
Na boca de silêncio e paz,
Ouve o progresso no ouvido de ausência
Do real frívolo de sempre,
O monótono labirinto de alma
Que rasga imaginação colorida de lápis de cera
Nos dedos da ansiedade de crescer até ser noite,
Sou irreal, não alcanço arestas,
As teias de rostos de sons oblíquos que
Faz a cabeça bater sincronizada em utensílios
E olfacto de rasto de me perder
Em bonecos andarilhos que mastigam as palavras
Para dentro, para fora
Até ser outro sentido.

Eu

Ser alguém que recordo não sendo eu,
Esquecimento de sentir,
Ainda a farsa de me não reconhecer, ainda não,
Talvez amanhã mais ou menos eu que sou,
Que me descubro e reconheço,
A minha veia de sangue, o meu corpo só,
Apago coincidências, ando em aparências,
Miro o espelho de dentes plano de reticências de luz,
O sagrado e o profano,
Bonecos despojados de olhos,
Os pés salientes, a cama chora a imagem de roupas,
Embaciado de glória de humanismo
E três desejos de rir como nada que digo,
Sentimento ao de leve como uma ferida,
Enfim piano cálido de pressentir o medo de mim.

Cidade

Como embriagada é a vida em lenta agonia,
A placidez de momentos como um náufrago, como barco ou cruz,
Os nós demorados de ninguém e a certeza de somente palidez ou ramos,
Agita noite a imagem de vento,
A manhã incolor que desfolho o acordar nu,
A semente e a súplica,
A morada, a estrada,
Estáticamente o rugido de uma mão,
Cegos e ciganos e crianças,
Uma escola, um prédio,
O sonho começa na cidade
Resmunga os dias,
O céu espera por eternidade,
Desliza a palavra no café de soluço
E uma conta faz uma tapeçaria no momento de dizer até sempre
Como antigamente se escavassem detritos,
Como se apagasse a luz dos cegos
E se ungisse de sono
O leito cor de rosa de tigres de savana.

Sentidos

Não me vejo, não reconheço ao ver
A cara, o contorno de papiro,
A leve sobrancelha rodeando a cavidade de globo ócular,
A boca pálida, um soluço,
Uma vaga imagem de côr que rodeia a sala como sombra
Como ideia que insisto e nula por não ser real,
Ergo a luz e uma lua de pastel cinzelada de brilhantes,
Corpo inerte quando me deito extasiado,
Verso de madrugada, do regresso e de progresso,
Enredo de praça de hoje ser um dizer que não interessa,
Mais folhas e papéis que risco com cruzes como dias prisioneiros de vida,
Uma sopa de fome que sacio como palavra de rosto
E um carrossel de filmes idiotas
No silêncio de ócio, de ódio,
De palavras negras e negação de palavras que não se lêem,
São machucadas e raspadas como manhã, como Verão,
Nisto de inútil que são palavras,
A arte palavra que sai da boca e desce no som de palavra
Até ser ouvida na orelha distante,
O som é significado e transformado, centrifugado em resposta de palavras como um processo
De comunicação como nariz que cheira
Ou mão que aperta uma mão sentindo o tacto.

Em Sonhos

Em sonhos morri parado e quieto,
Ninguém que sou distante,
Os olhos fechados, as mão em cruz no desejo,
Este eu navega em sombras e 
Guerreiro de alma que cala a morte,
Acorda de cabeça em punho na existência,
Trouxe-me tão lento e enraivecido por pensar
Nisto de morrer há décadas dentro de mim,
Em sonhos doloridos e apagados,
Todos os dias novo rosto e desconheço-me
Ao som de pensamento azul que se dilui ao vento pardo da manhã,
Ser dia de existir e sobreviver em meus ombros desníveis de soluços
E rugidos de ruminar quando sonho um sonho morre atrás de mim
E renasço em vida de sonho que uso num olhar que permanece
Como um livro de horas,
Quando é dia de rir estremeço à luz de Sol,
É sempre dia no oceano de trompete
Que ouço maquinalmente todo os dias em que sonhos embriagados
Adormecem a meu lado.

Estátuas

Neste oceano, sons ocos de ondas
Em praias, areias,
Somos um homem, uma criança
Dispersas como vento dentro de nós,
O assunto ondeia como labirinto,
A alma espreita, assustada,
Por dia final,
A inauguração de uma lápide da memória,
Os ossos, o crânio
Ainda demoram no corpo
Lento de fugir para onde o sonho dorme,
Em desenhos de parede,
Num berlinde, no fundo do tempo
Onde a máscara de lua emigra no espaço
De ser eternidade
Até ao limite inventado de estátuas.

Pergunta

Que tem este jeito de nada ter senão a pergunta
Se terei algo meu,
Nada tenho senão um gesto,
Este ódio despenteado, este modo embaraçado
De perseguir-me à exaustão
Como fantasma de ópera
Numa redoma de vidro,
Sei existir e persisto em não sair de ambição apenas,
Sou o indizível de mim mesmo como um carpir de olhos
Na esteira de adormecer serenamente como pomba
Ou entoação de grito disforme de socorro,
Sei a palavra que desidrata,
Amar como nada e papéis
Sobretudo os papéis e a voz zonza, estridente,
O carro passa longamente
E um disparate que ri no espelho das imagens,
Cimento em camadas,
A altura de não alcançar o movimento de cair
E geralmente não ser idade, não ser som
Na maior parte do tempo que escorre impaciências
De cópia como cábulas destino de futuro
Que desaparece sem marcas.

Olhar Parado

A impaciência do olhar parado,
Aguarda instruções de ser dia,
Ser sinal que chora,
A palavra sem sentido
Porque não existe no que pensamos,
A mórbida curiosidade de Sol
É a voz dos tempos,
A glória de habitar a imagem,
A acção de guarda chuvas,
O planeta não sorri
No acto de dor queimada,
Labirintos desabrigados
Encenação doentia, calada e ausente no grito contido,
Ainda o segredo da caixa de musica da bailarina cega,
O poeta cuspindo,
A viúva que morre todos os dias,
A palavra encenação de código
Como leques destituídos de carne tresloucada
No instante em que adormeço a vida.

Frio Demente

Hoje deriva o nada,
Fogo de pardais e um lenço,
Amanhã a gaivota prende a asa no sonho diluído,
Desisto da calma em rostos de ir dentro de mim,
Regresso a um torso, uma vaga retumbância,
Um acorde de náufrago de cetim marinho e ténue,
Ainda existo nas letras como um ninho
E um caminho que empurra a minha força que resiste
Em tempos de costuras e medicamentos
Como um pêssego que trouxe no bolso,
A merenda num dia de Sol,
Calmo o olfacto que respira a maré que incomoda,
Acaricio o rosto de fim de viagem,
Tantas feridas que não sinto,
Tanta palidez no toque,
Que frio demente isto que sinto.

Desilusão

Infeliz desilusão convalescente,
Nasce o grito na face,
Em ondas desiguais, campos, imagens de frio,
O riso é pálido e sôfrego,
Mastigo vogais, sofro o álcool destilado numa lágrima,
A janela desunida é um animal de raiva
Nesta tarde que suspira letras e cores
Que são um abecedário de crianças de óculos
Resmungando a vida deitada,
Subi ao conceito que cai pela montanha
No precipício de nuvem de almas,
Sempre a melancolia que recordo
Como este encolher de ombros,
Nesta paz de minutos morna e sufocante
De erguer o verso que como alfaiate
Costurando impaciências
De corpos estrelas
E corpos demorados
Com pedras que andam como castelo construído
Na minha mente que serena
Ao vento de imaginação num enredo
De praia e mundo.

A Casa

A casa move-se como um circuito,
A casa tem árvores e um ramo de jasmim,
Em fronteiras de morte o objecto labareda
Acena como esquece cinza
Que afaga o chão de mar,
Acalma espírito, ainda mar,
Ainda me afogo no vento,
Há transtorno em cavar o assunto, escasseia no arroz
De refeição da casa,
Arranho a asa convalescente num arrepio,
Tanto e nada como olhos pintados,
Emigro em momentos de estar em todo o lado,
A casa mexe-se no tato rugoso da parede,
A rapariga toca na porta da morada a seguir ao rosto
Derrotado,
Num pano, num dedo,
Um germe de horror na porta, na janela,
Na palavra passe do encenador da casa
Faz silêncio.

Janelas

Rosas como teias derivam das janelas
Beijando a manhã,
O mocho, o lírio e o corpo acordam
Trajando um passo apressado no jardim dos silêncios,
Tudo o que me rodeia
A teatralizar, esculpindo o verso,
Letras de paz rompem no rosto como ouvidos em segundos de prece,
No jardim do momento em que se olha duas faces agonizando
No desejo, no deserto de si mesmos,
A pirâmide do asfalto ergue o sonho
Que insinua vento ao passar o húmido suspiro
De nada dizer como um segredo de livro exausto
Na cabeceira da cama que se arrasta na ambição de luz
E olhos que choram futuro,
Os pés são frios nos lençóis que exalam um perfume de alfazema,
São muitos desunidos ais,
São muitas as mágoas que me adormecem os sentidos
De Sol que não escurece o dia
Que como roda traz-me o sonho de ser noite
Tudo o que recordo.

Faz-me Falta

Faz-me falta como sentisse que não me faz falta
Esta imagem decadente,
Este estado inquieto,
A suave distância de presságio como uma carta
Ou uma lua de risos em tardes de cores afuniladas em verso,
A maneira secreta de ouvir a imagem parada do futuro
Que em nós se mexe
Como voo de águia nos penhascos de alma
No irreal, no texto semi-frio,
Na nota de pena suicida,
Em vagões de rodas de mar azul pálido,
Refrescos em vãos de escada
A sorver os assuntos.
É um caminho demente em torno da luz
Que respira o suor,
O corpo, o umbigo,
Esta esperança de olhos turvos,
A madrugada de xaile
Que dança nas mulheres acesas ao grito de multidão que se perde.